1. Hermafroditismo e Unissexualidade
Examinando o instinto sexual em sua
complexidade nas linhas multiformes da vida, convêm lembrar que, por milênios e
milênios, o princípio inteligente se demorou no hermafroditismo das plantas,
como, por exemplo, nos fanerógamos, em cujas flores os estames e pistilos
articulam, respectivamente, elementos masculinos e femininos.
Nas plantas criptogâmicas celulares e
vasculares ensaiara longamente a reprodução sexuada, na formação de gametos
(anterozôides e oosfera) que muito se aproximam aos dos animais e cuja
fecundação se efetua por meios análogos aos que observamos nestes últimos
seres.
Depois de muitas metamorfoses que não cabem
num estudo sintético quanto o nosso, caminhou o elemento espiritual, na
reprodução monogônica, entre as vastas províncias dos protozoários e
metazoários, com a divisão e gemação entre os primeiros, correspondendo à cisão
ou estrobilação entre os segundos.
Longo tempo foi gasto na evolução do instinto
sexual em vários tipos de animais inferiores, alternando-se lhe os estágios de
hermafroditismo com os de unissexualidade para que se lhe aperfeiçoassem as
características na direção dos vertebrados.
2. Hermafroditismo potencial
Gradativamente, aparecem novos fatores de
diferenciação, guardando-se, no entanto, os distintivos essenciais, como
podemos identificar, ainda agora, no sapo macho adulto um hermafrodita
potencial, apesar dos sinais masculinos com que se apresenta, sabendo-se que
carrega na região do seu testículo, positivamente acrescido, um ovário
elementar aderente, o conhecido corpo de Bidder.
Se extirparmos o testículo, o ovário
atrofiado começa a funcionar, por atuação da hipófise, conforme experimentos
comprovados, convertendo-se num ovário adulto.
Ocorrência inversa é verificável em cinco a
dez por cento de galinhas adultas, isto é, nos indivíduos psiquicamente
dispostos, das quais, se retirarmos o ovário esquerdo, também consideravelmente
desenvolvido, o ovário direito, rudimentar, transubstancia-se num testículo que
se vitaliza e cresce, na sua parte medular, até então inibida pelos estrogênios
do ovário esquerdo.
Nesse fenômeno, aumenta-se lhes a crista,
cantam tipicamente à maneira do galo e adotam-lhe a conduta sexual masculina.
Registramos esses fatos para demonstrar que
entre todos os vertebrados e muito particularmente no homem, herdeiro das mais
complicadas experiências psíquicas, nos domínios da reencarnação, apenas os
caracteres morfológicos dos implementos sexuais estão submetidos aos princípios
da genética.
Isso porque não é só a figuração das
glândulas sexuais que se mostra bipotencial até certo ponto, pois todo o cosmo
orgânico é suscetível de reagir aos hormônios do mesmo sexo ou do sexo
contrário, segundo as disposições psíquicas da personalidade.
3. Ação dos Hormônios
Atingindo inequívoco progresso em seus
estímulos, o corpo espiritual, desde a protoforma psicossômica nos animais
superiores até o homem, conforme a posição da mente a que serve, determina mais
ampla riqueza hormonal.
As glândulas sexuais que então mobiliza são
mais complexas. Exercem a própria ação pelos hormônios que segregam,
arrojando-os no sangue, hormônios esses, femininos ou masculinos, que possuem
por arcabouço da constituição química, em que se expressam, o núcleo
ciclo-pentano-peridrofenantreno, filiando-se ao grupo dos esteróis.
Os hormônios estrogênicos, oriundos do
ovário, mantêm os caracteres femininos secundários, e os androgênicos,
segregados pelo testículo, sustentam os caracteres masculinos da mesma ordem.
Produzem ações estimulantes e inibitórias,
todavia, como atendem necessariamente a impulsos e determinações da mente, por
intermédio do corpo espiritual, incentivam o desenvolvimento ou a maneira de
proceder da espécie, mas não os origina.
Por isso, nenhum deles possui ação
monopolizadora no mundo orgânico, não obstante patentearem essa ou aquela
influência de modo mais amplo.
Ainda em razão do mesmo princípio que lhes
vige na formação, pelo qual obedecem às vibrações incessantes do campo mental,
os hormônios não se armazenam: transformam-se rapidamente ou sofrem apressada
expulsão nos movimentos excretórios.
Entendendo-se os recursos da reprodução como
engrenagens e mecanismos de que o Espírito em evolução se vale para a plasmagem
das formas físicas, sem que os homens lhe comprovem, de modo absoluto, as
qualidades mais íntimas, é fácil reconhecer que as glândulas sexuais e seus
hormônios exibem efeitos relativamente específicos.
Inegavelmente, o ovário e os hormônios femininos
se responsabilizam pelos distintivos sexuais femininos, mas podem desenvolver
alguns deles no macho, prevalecendo as mesmas diretrizes para o testículo e os
hormônios que lhe correspondem.
Isso é claramente demonstrável nos
experimentos de castração, enxertos e injeções hormonais, porquanto, apesar de
a ação sexual específica do testículo e do ovário apresentar-se como fato
indiscutível, a gônada, refletindo os estados da mente, herdeira direta de
experiências inumeráveis, eventualmente produz certa quantidade de hormônios heterossexuais
e, da mesma sorte, ainda que os hormônios sexuais se afirmem com atividade
específica intensa, em determinados acontecimentos realizam essa ou aquela ação
em órgãos do sexo oposto. Esses são os efeitos heterossexuais ou bissexuais das
glândulas ou dos hormônios.
4. Origem do Instinto Sexual
Todas as nossas referências a semelhantes
peças do trabalho biológico, nos reinos da Natureza, objetivam simplesmente
demonstrar que, além da trama de recursos somáticos, a alma guarda a sua
individualidade sexual intrínseca, a definir-se na feminilidade ou na
masculinidade, conforme os característicos acentuadamente passivos ou
claramente ativos que lhe sejam próprios.
A sede real do sexo não se acha, dessa
maneira, no veículo físico, mas sim na entidade espiritual, em sua estrutura
complexa.
E o instinto sexual, por isso mesmo,
traduzindo amor em expansão no tempo, vem das profundezas, para nós ainda
inabordáveis, da vida, quando agrupamentos de mônadas celestes se reuniram
magneticamente umas às outras para a obra multimilenária da evolução, ao modo
de núcleos e eletrões na tessitura dos átomos, ou dos sóis e dos mundos nos
sistemas macrocósmicos da Imensidade.
Por ele, as criaturas transitam de caminho a
caminho, nos domínios da experimentação multifária, adquirindo as qualidades de
que necessitam; com ele, vestem-se da forma física, em condições anômalas,
atendendo a sentenças regeneradoras na lei de causa e efeito ou cumprindo
instruções especiais com fins de trabalho justo.
O sexo é, portanto, mental em seus impulsos e
manifestações, transcendendo quaisquer impositivos da forma em que se exprime,
não obstante reconhecermos que a maioria das consciências encarnadas permanecem
seguramente ajustadas à sinergia mente-corpo, em marcha para mais vasta
complexidade de conhecimento e emoção.
5. Evolução do Amor
Entretanto, importa reconhecer que à medida
que se nos dilata o afastamento da animalidade quase absoluta, para a
integração com a Humanidade, o amor assume dimensões mais elevadas, tanto para
os que se verticalizam na virtude como para os que se horizontalizam na
inteligência.
Nos primeiros, cujos sentimentos se alteiam
para as Esferas Superiores, o amor se ilumina e purifica, mas ainda é instinto
sexual nos mais nobres aspectos, imanizando-se às forças com que se afina em
radiante ascensão para Deus.
Nos segundos, cujas emoções se complicam, o
amor se requinta, transubstanciando-se o instinto sexual em constante exigência
de satisfação imoderada do “eu”.
De conformidade com a Psicanálise, que vê na
atividade sexual a procura incessante de prazer, concordamos em que uns, na
própria sublimação, demandam o prazer da Criação, identificando-se com a Origem
Divina do Universo, enquanto que outros se fixam no encalço do prazer
desenfreado e egoístico da auto-adoração. Os primeiros aprendem a amar com
Deus. Os segundos aspiram a ser amados a qualquer preço.
A energia natural do sexo, inerente à própria
vida em si, gera cargas magnéticas em todos os seres, pela função criadora de
que se reveste, cargas que se caracterizam com potenciais nítidos de atração no
sistema psíquico de cada um e que, em se acumulando, invadem todos os campos
sensíveis da alma, como que a lhe obliterar os mecanismos outros de ação, qual
se estivéssemos diante de usina reclamando controle adequado.
Ao nível dos brutos ou daqueles que lhes
renteiam a condição, a descarga de semelhante energia se efetua,
indiscriminadamente, através de contatos, quase sempre desregrados e infelizes,
que lhes carreiam, em consequência, a exaustão e o sofrimento como processos
educativos.
6. Poligamia e Monogamia
O instinto sexual, então, a desvairar-se na
poligamia, traça para si mesmo largo roteiro de aprendizagem a que não escapará
pela matemática do destino que nós mesmos criamos.
Entretanto, quanto mais se integra a alma no
plano da responsabilidade moral para com a vida, mais apreende o impositivo da
disciplina própria, a fim de estabelecer, com o dom de amar que lhe é
intrínseco, novos programas de trabalho que lhe facultem acesso aos planos
superiores.
O instinto sexual nessa fase da evolução não
encontra alegria completa senão em contato com outro ser que demonstre plena afinidade,
porquanto a liberação da energia, que lhe é peculiar, do ponto de vista do
governo emotivo, solicita compensação de força igual, na escala das vibrações
magnéticas.
Em semelhante eminência, a monogamia é o
clima espontâneo do ser humano, de vez que dentro dela realiza, naturalmente,
com a alma eleita de suas aspirações a união ideal do raciocínio e do
sentimento, com a perfeita associação dos recursos ativos e passivos, na
constituição do binário de forças, capaz de criar não apenas formas físicas,
para a encarnação de outras almas na Terra, mas também as grandes obras do
coração e da inteligência, suscitando a extensão da beleza e do amor, da
sabedoria e da glória espiritual que vertem, constantes, da Criação Divina.
7. Alimento Espiritual
Há, por isso, consórcios de infinita gradação
no Plano Terrestre e no Plano Espiritual, nos quais os elementos sutis de
comunhão prevalecem acima das linhas morfológicas do vaso físico, por se
ajustarem ao sistema psíquico, antes que às engrenagens da carne, em circuitos
substanciais de energia.
Contudo, até que o Espírito consiga purificar
as próprias impressões, além da ganga sensorial, em que habitualmente se
desregra no narcisismo obcecante, valendo-se de outros seres para satisfazer a
volúpia de hipertrofiar-se psiquicamente no prazer de si mesmo, numerosas
reencarnações instrutivas e reparadoras se lhe debitam no livro da vida, porque
não cogita exclusivamente do próprio prazer sem lesar os outros, e toda vez que
lesa alguém abre nova conta resgatável em tempo certo.
Isso ocorre porque o instinto sexual não é
apenas agente de reprodução entre as formas superiores, mas, acima de tudo, é o
reconstituinte das forças espirituais, pelo qual as criaturas encarnadas ou
desencarnadas se alimentam mutuamente, na permuta de raios psíquico-magnéticos
que lhes são necessários ao progresso.
Os espíritos santificados, em cuja natureza
superevolvida o instinto sexual se diviniza, estão relativamente unidos aos
Espíritos Glorificados, em que descobrem as representações de Deus que
procuram, recolhendo de semelhantes entidades as cargas magnéticas sublimadas,
por eles próprios, liberadas no êxtase espiritual. De outro lado, as almas
primitivas comumente lhe gastam a força em excessos que lhes impõem duras
lições.
Entre os espíritos santificados e as almas
primitivas, milhões de criaturas conscientes, viajando da rude animalidade para
a Humanidade enobrecida, em muitas ocasiões se arrojam a experiências menos
dignas, privando a companheira ou o companheiro do alimento psíquico a que nos
reportamos, interrompendo a comunhão sexual que lhes alentava a euforia, e, se
as forças sexuais não se encontram suficientemente controladas por valores
morais nas vítimas, surgem, frequentemente, longos processos de desespero ou de
delinquência.
8. Enfermidades do Instinto Sexual
As cargas magnéticas do instinto, acumuladas
e desbordantes na personalidade, à falta de sólido socorro íntimo para que se
canalizem na direção do bem, obliteram as faculdades, ainda vacilantes, do
discernimento e, à maneira do esfaimado, alheio ao bom senso, a criatura lesada
em seu equilíbrio sexual costuma entregar-se à rebelião e à loucura em
síndromes espirituais de ciúme ou despeito.
À face das torturas genésicas a que se vê
relegada, gera aflitivas contas cármicas a lhe vergastarem a alma no espaço e a
lhe retardarem o progresso no tempo.
Daí nascem as psiconeuroses, os colapsos
nervosos decorrentes do trauma nas sinergias do corpo espiritual, as fobias
numerosas, a “histeria de conversão”, a “histeria de angústia”, os “desvios da
libido”, a neurose obsessiva, as psicoses e as fixações mentais diversas que
originam na ciência de hoje as indagações e os conceitos da psicologia de
profundidade, na esfera da Psicanálise, que identifica as enfermidades ou
desajustes do instinto sexual sem oferecer-lhes medicação adequada, porque
apenas o conhecimento superior, gravado na própria alma, pode opor barreiras à
extensão do conflito existente, traçando caminhos novos à energia criadora do
sexo, quando em perigoso desequilíbrio.
Desse modo, por semelhantes rupturas dos
sistemas psicossomáticos, harmonizados em permutas de cargas magnéticas afins,
no terreno da sexualidade física ou exclusivamente psíquica, é que múltiplos
sofrimentos são contraídos por nós todos, no decurso dos séculos, porquanto, se
forjamos inquietações e problemas nos outros, com o instinto sexual, é justo
venhamos a solucioná-los em ocasião adequada, recebendo por filhos e associados
de destino, entre as fronteiras domésticas, todos aqueles que constituímos
credores do nosso amor e da nossa renúncia, atravessando, muitas vezes,
padecimentos inomináveis para assegurar-lhes o refazimento preciso.
Compreendamos, pois, que o sexo reside na
mente, a expressar-se no corpo espiritual, e consequentemente no corpo físico,
por santuário criativo de nosso amor perante a vida, e, em razão disso, ninguém
escarnecerá dele, desarmonizando-lhe as forças, sem escarnecer e desarmonizar a
si mesmo.
Compilado por Harmonia Espiritual
Livro: Evolução em Dois Mundos