Nada é por acaso

Nada é por acaso!, este é um jargão muito comum no meio espírita, assim como: “Deus não joga dados!” (Albert Einstein) ou “O telefone só toca de lá para cá” (Chico Xavier), entre outros. Mas, quais são as implicações de tal afirmativa? Como devemos entendê-la?


Primeiramente, devemos analisar o que vem a ser o acaso. O acaso, ao contrário do que muitos pensam, não vem a ser uma exceção à lei de causa e efeito, mas, sim, mostra-se como seu marco inicial. Antes de sua ocorrência, há o caos, ou seja, o império da aleatoriedade, onde as leis ou regras não passam de simples possibilidades probabilísticas.


Porém, num determinado momento, o caos, regido pela aleatoriedade, encontra uma configuração que alcança o estado de “Ordem”, permitindo assim a manifestação de um fato. A partir da ocorrência desse fato “Ordem”, há o encadeamento de outros fatos, que serão guiados pelos fatos que lhes são pregressos, fazendo surgir a corrente infinita de causa e efeito.

Essa mecanicidade impõe uma total e completa ausência de significado aos fatos, bem como a sua posterior corrente de manifestação (causa e efeito). Sob o ponto de vista lógico, isso justifica a concepção de um universo amoral, regido única e exclusivamente por leis desprovidas de intenção e objetivo, pois estas, assim como os fatos, têm origem no caos, célula “mater” de toda a realidade.

Dessa forma, segundo essa visão, toda ocorrência que se dê em qualquer dimensão da realidade não terá nenhum significado, sendo apenas uma manifestação do acaso. O significado dos fatos decorreria apenas da interpretação do observador atento, que o faria de acordo com sua perspectiva e limitações. Portanto, a significância dos fatos seria uma adjetivação dada pelo sujeito, não configurando algo substantivo aos fatos per si.

Afirmar que “Nada é por acaso!” implica necessariamente rechaçar o conceito de que o caos figura como matriz da infinita corrente factual de causa e efeito; também implica, em substituí-lo por algo provido de significado, intenção e objetivo, pois, somente assim, os fatos provenientes dessa fonte inicial não seriam manifestações do acaso, pois trariam em si uma intenção, um objetivo e, portanto, um significado.

Para o Espiritismo, essa fonte inicial é Deus, como bem leciona a primeira questão de “O Livro dos Espíritos”. Questão n° 01: Que é Deus? Resposta: Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas. Assim, todo fato do universo tem como origem Deus, sendo que após sua manifestação, este passa a ser regido por leis, leis estas também de origem Divina.

Dentre as leis Divinas que estruturam o universo, se destaca a “lei de causa e efeito”. Para dimensionarmos sua importância, basta que compreendamos que ela é a principal responsável por gerar todo o conhecimento científico produzido pela humanidade, além de ser o elo entre o conhecimento espírita e o já mencionado conhecimento científico.

Entretanto, outro importante elemento deve ser incluído neste sistema, afastando seu cartesianismo e o aproximando da dinâmica do caos por meio de um componente limitado de indeterminação. Este componente é o “livre-arbítrio”.

O livre-arbítrio é um componente limitado de indeterminação, pois é uma das características do elemento espiritual que atingiu o estado “razão”, a qual permite a esse o ato da escolha, conforme nos ensina a questão n° 75-a de “O Livro dos Espíritos”.
   
Questão n°75-a: Por que a razão não é sempre um guia infalível? Resposta: Ela seria infalível se não fosse falseada pela má educação, pelo orgulho e pelo egoísmo. O instinto não raciocina; a razão permite a escolha e dá ao homem o livre-arbítrio.

Sendo o livre-arbítrio individual e limitado, como o Espírito que o dá origem o é, este por sua vez, pode ser qualificado e sobretudo quantificado por Espíritos de nível superior. Em outras palavras, todos os Espíritos detêm o livre-arbítrio, no entanto, esse livre-arbítrio é limitado às suas capacidades (status evolutivo) e tendências (lei de causa e efeito).

Tomemos um exemplo para melhor evidenciar isso. O Espírito X atuou como médico durante 3 (três) reencarnações consecutivas, dessa forma, numa nova reencarnação, a probabilidade desse Espírito X ser novamente um médico é muito mais alta do que a de ele ser um advogado.

Por ele ser um Espírito, e, portanto, um ser finito e limitado em sua essência, este pode ser analisado por completo por um Espírito superior, podendo ter todas as suas características e tendências catalogadas e, mais importante, quantificadas.

Através da acumulação e análise desses dados e informações, os Espíritos celestes são capazes de prospectar e prever as manifestações (atos) dos Espíritos inferiores, tanto individual quanto coletivamente. Dessa forma, mesmo respeitando o livre-arbítrio coletivo e individual, estes Espíritos superiores são capazes de ordenar e planejar nosso avanço rumo aos objetivos de progresso traçados pela Divindade.

Esta previsibilidade se deve ao fato de que à medida que o Espírito evoluciona, através do exercício de seu livre-arbítrio nas suas diversas experiências reencarnatórias, ele, paulatinamente, se afina às leis Divinas, assimilando-as à sua própria consciência e vontade.

Assim, progressivamente, a Vontade do Pai se torna a vontade do filho, não havendo mais espaço para a contradição geradora dos conflitos e reveses impostos pela magna lei de causa e efeito.

Neste caso, afirmar que “Nada é por acaso!” é reconhecer que tudo é planejado, que nada que ocorre é aleatório ou imprevisto, tudo tem uma razão de ser, e tudo que se manifesta tem um objetivo finalístico traçado inicialmente pela Divindade, a qual, através de seus prepostos críticos, supervisiona e coordena este avanço.

Enfim, tenhamos em mente que, independentemente da utilização usual dada a essa expressão, ela corresponde à aplicação do princípio da humildade, no que tange ao reconhecimento da Suprema Força Ordenadora de Deus no universo. Portanto, continuemos a utilizá-la, mas detendo o conhecimento de algumas de suas implicações. 

Fonte.: Texto de Fabrício Pelizer Gregório