Nas Fronteiras da Loucura
Manoel P. de Miranda - Divaldo Pereira Franco
Centro Espírita Nosso Lar – Grupo de Estudos das obras
de André Luiz e de Manoel Philomeno de Miranda.
15. No Sanatório
O Nosocômio não se destinava apenas ao tratamento dos pacientes encarnados. A população que ali se agitava formava uma espécie de comunidade viva, onde as soberanas leis haviam estabelecido um programa de lapidação íntima para a quase generalidade de seus membros.
Para uns, encarnados ou não, fazia-se um purgatório, no qual as aflições selecionavam os mais aptos ao progresso, em razão da humildade, da resignação ante os imperiosos resgates de que se faziam devedores pela intemperança e desequilíbrio em que delinqüiram.
Outros defrontavam a oportunidade de aprender servindo e de amar o próximo, na contingência das amargas e rudes reparações. Número expressivo deles, inconscientemente, tornava-se, instrumento da Vida, fomentando o próprio crescimento e daqueles a quem afligia. Aquilo parecia uma estranha cidade, com suas regras, suas características, sua população e governança, dentro de outra cidade.
Uma Entidade muito perversa atribuía-se o direito e o dever de administrar os corretivos aplicados na comunidade, inteirando se das ocorrências que ali sucediam e tentando combater a interferência do Bem. Ganhara o posto, como conquista natural, em se considerando sua folha de serviços, assinalada pela impiedade e crueza dos métodos que aplicava em seus adversários ou vítimas.
Os enfermos encarnados sofriam, assim, sevícias cruéis de seres impenitentes de ambas as esferas de ação: do corpo, através de funcionários inescrupulosos em sintonia com os Espíritos vingativos, e fora dele. Os desencarnados, igualmente alienados, sofriam por sua vez subjugações cruéis sob tormentos inenarráveis, nas mãos dos seus sicários, dos quais a morte não os libertara.
A ação do bem, contudo, se fazia presente, auxiliando uns e outros, ao mesmo tempo que clarificava as mentes e apontava rumos para os futuros lidadores das desobsessões e terapias psiquiátricas. Foi assim que o Dr. Artur Figueiredo recebeu-os afetuosamente, prontificando-se a auxiliá-los no ministério da caridade, tão logo se inteirou do motivo da visita.
A enferma estava em um apartamento especial, adormecida sob a alta dose de um antidepressivo. O ambiente, em razão da psicosfera geral, era irrespirável. Espíritos perturbados e irresponsáveis tomavam o recinto, embora não fossem necessariamente vinculados à paciente. (Cap. 2, pp. 27 e 28)
16. O caso Julinda
O diretor espiritual da Casa informou tratar-se de jovem senhora de 25 anos, vitimada pela irresponsabilidade moral. E ajuntou: "Apesar de haver renascido por intermédio de abnegada genitora, que se comprometeu ampará-la no cometimento atual, quando deveria elevar-se pelo amor e pela abnegação, ela preferiu derrapar, invigilante, assumindo mais graves compromissos negativos".
O dirigente ressalvou que não fazia qualquer censura, apenas uma constatação, para mostrar que a falta de visão a respeito da vida como um todo responde por muitas insânias a que se entregam os homens.
"Quando se compreenda que o corpo é efeito e não causa da vida, no qual se estabelecem as bases da elevação; quando se conscientizem os seres de que o berço é porta que se descerra para o corpo quanto o túmulo é a que se fecha, sem que ninguém entre ou saia da vida; quando se estabeleçam metas que transponham os limites de uma breve existência corporal, ser, acentuou o diretor, diversa a atitude a assumir-se ante as ocorrências e circunstâncias do dia-a-dia."
Na seqüência, o antigo discípulo de Freud asseverou: "Somente a visão reencarnacionista responde pela forma de uma perfeita integração do Espírito no processo da ascensão. Nossa irmã Julinda é uma prova disso. O seu drama atual tem raízes muito profundas, que se encontram fixadas nas existências passadas".
A moça apresentava um quadro de psicose maníaco-depressiva, com gravidade crescente. Da euforia inicial passara à depressão angustiante, armando um esquema de autodestruição. Nenhum tratamento, sejam as duchas, os opiáceos, os barbitúricos ou o eletrochoque, produziu resultados expressivos. (Cap. 2, pp. 28 e 29)
17. As causas reais da enfermidade
Dr. Bezerra acercou-se da paciente e, após examiná-la detidamente, considerou: "E' lamentável que persista a distância entre a terapia psiquiátrica e a psicoterapêutica espiritual. No caso em tela, têm redundado infrutíferos, senão perniciosos, os tratamentos à base dos derivados de barbitúricos, quanto do eletrochoque.
Do ponto de vista psiquiátrico discute-se que a PMD quanto a esquizofrenia são uma psicose endógena, cuja causa se encontra nos genes, transmitida hereditariamente de uma para outra geração, sendo, em conseqüência, uma fatalidade inditosa e irremissível para os descendentes de portadores da mesma enfermidade, especialmente nas vítimas da chamada convergência hereditária".
"Afirma-se, dentro desta colocação, acentuou Dr. Bezerra, que o desvio patológico exagerado da forma de ser ciclóide, somado a uma formação física pícnica, no qual estão presentes as forças predominantes das glândulas viscerais encarregadas da determinação do humor, faz-se responsável pelo quadro da psicose maníaco-depressiva."
“PMD significa psicose maníaco-depressiva. Ciclóide diz-se do tipo em geral rubicundo, pessoa muito corada, vermelha, de cara redonda, jovial, displicente, porém sujeito a períodos de depressão discreta; o mesmo que ciclotímico, esquizóide. Pícnico diz respeito ao tipo de pessoa de forma arredondada, baixa e reforçada, correspondente ao caráter ciclotímico, ciclóide, esquizóide.).
Dr. Bezerra aludiu, em seguida, de passagem, às outras correntes explicativas da PMD: as que a associam às alterações endócrinas, as que a atribuem às variações do quimismo orgânico, bem como as que procuram as causas dessa alienação na prevalência das reações do êxito e do insucesso, que responderiam pelos choques impostos ao narcisismo de cada um, facultando o eclodir da distonia.
E, depois de ligeira pausa, concluiu: "Embora alguns desses fatores estejam presentes no quadro da nossa Julinda, como estudaremos, são eles conseqüências de causas remotas que os produziram ao império da atual reencarnação". (Cap. 2, pp. 29 e 30)
18. Nosso comportamento é que gera a dor
Na patogênese da alienação mental, defrontaremos sempre um Espírito falido em si mesmo, sob a injunção reparadora, de que não se pode apartar, senão mediante o cumprimento da justa pena a que se submete pelo processo da evolução.
As Leis de Deus não podem sofrer defraudações, sem que se estabeleçam critérios automáticos de recomposição, em cujo mister se envolvem os que agem com desregramento ou imprevidência.
Toda criatura traz em si o gérmen, a noção do bem e do mal, em cuja vivência programa o céu ou o inferno a que se vincula, gerando as matrizes das alegrias ou dores que passam a constituir-lhe o “modus vivendi” do futuro, atividade pela qual ascende ou recupera os prejuízos que se impôs.
Programado para a ventura, o Espírito necessita das experiências que o promovem modelando nele o querubim, embora às vezes, quando tomba, pareça um satanás, que a luta desvestirá da armadura perniciosa que o estrangula, fazendo que liberte a essência divina que nele vige, inalterada.
Quem elege a paisagem pestilencial, nela encontra motivos de êxtase, tanto quanto aquele que ama a estesia penetra-se de beleza na contemplação de um raio de sol ou de uma flor... Não existe, pois, uma dor única, na alma humana, que não proceda do próprio comportamento, sendo mais grave o deslize que se apóia na razão, capaz de distinguir as balizas demarcatórias da responsabilidade que elege a ação edificante ou a comprometedora.
A única exceção é a de Jesus, o Justo por excelência, que viveu a problemática da aflição imerecida, para lecionar coragem, resignação, humildade e valor ante o sofrimento, de modo que ninguém se exacerbe ou desvarie ao expungir as penas a que faz jus. (Cap. 3, pp. 31 e 32)
Percebendo que Manoel P. de Miranda estava compungido ante o estado de Julinda, Dr. Bezerra o advertiu recomendando a vigilância educativa:Confrange-nos acompanhar o padecimento dos nossos irmãos em desalinho, no entanto, a nenhum deles tem faltado a bênção do socorro de maneira direta ou não, da mesma forma que lhes não foram escassas a inspiração divina, as diretrizes para uma vida reta, nem os exemplos de comportamento digno, nos quais pautassem a própria conduta.
Havendo a opção com a qual cada um afina, derrapando na ação em que se compraz, a presença da justiça torna-se irrefragável para hoje ou mais tarde. Dr. Bezerra referiu ainda que antes mesmo de Jesus os romanos haviam estabelecido no seu código de Direito as bases da felicidade humana, condensando o Decálogo, inconscientemente, em três princípios fundamentais: "Viver honestamente. Dar a cada um o que é seu. Não lesar ninguém".
Mais tarde, Jesus resumiria toda as leis e os profetas na máxima: "Amar a Deus sobre todas as coisas e o próximo como a si mesmo", reunindo os conceitos romanos e o Decálogo no amor, mediante o desdobramento do não "fazer ao próximo o que não desejar que este lhe faça".
"Aqueles que se atribuem direitos e privilégios especiais, na má usança a que se permitem, acentuou Dr. Bezerra, aliciam os verdugos que os submeterão, como conseqüência do comportamento ingrato e pernicioso de que se utilizam, vindo a experimentar o corretivo que os despertará para o respeito ao seu irmão e aos quadros educadores da escola terrena."
Evidentemente, isso não nos libera do dever de ajudar quem passa por semelhante provação, mas nos ajuda a vigiar os próprios pensamentos e atos. Dito isto, Dr. Bezerra pediu:
"Mantenhamos a nossa solidariedade e participemos das suas emoções, sem nos deixarmos contaminar pelos miasmas do desânimo, do medo, ou as ideoplastias fantasmagóricas, vitalizadas pela rebeldia e ingratidão ao Pai Criador e ao Cristo-Amor".
Dr. Figueiredo aproveitou o ensejo para dizer que ali aprendera que nosso maior inimigo está dentro de nós mesmos: "é o egoísmo, que se credita somente méritos sem conceder ao próximo uma quota, mínima sequer, de direito equivalente". E acrescentou:
"O Espírito é o responsável por si mesmo, embora mergulhado no contexto da Excelsa Misericórdia de Deus, fomentando o próprio crescimento através da utilização dos recursos pedagógicos com os quais sintoniza espontaneamente".
(Cap. 3, pp. 33 e 34)
“A publicação do estudo continuará
nas próximas semanas”