Considerado por Allan Kardec
como um Espírito que produziu comunicações que traziam o cunho incontestável da
profundeza e da lógica, Erasto é um daqueles Espíritos a quem podemos chamar de sábio e
profundo conhecedor da fenomenologia mediúnica. Não por acaso são
encontradas muitas comunicações de sua autoria em um capítulo de “O
Evangelho segundo o Espiritismo” e por todo “O Livro dos Médiuns”.
O capítulo XX, “Influência
Moral do Médium”, é um destes. Tendo por objetivo aprofundar o conhecimento
sobre a influência moral do médium na produção dos fenômenos espíritas, este
capítulo é rico em informações para os espiritistas. Nele,
Kardec desejava precaver os adeptos do Espiritismo contra o perigo de
subestimar ou superestimar a influência dos médiuns na
transmissão dos despachos de além túmulo.
Ele deve ser estudado
atendendo ao sábio conselho dado pelo codificador, quando
alerta que o estudo prévio da teoria é indispensável, se o médium pretende
evitar os inconvenientes inseparáveis da falta de experiência. Aprendemos
neste capítulo que não existem médiuns perfeitos na Terra, mas bons
médiuns, o que segundo os Espíritos já é muito, pois eles são raros! Até
porque, “o médium perfeito seria aquele que os maus Espíritos jamais ousassem
fazer uma tentativa de enganar. O melhor é o que,
simpatizando somente com os bons Espíritos, tem sido enganado menos vezes.
É importante observar este
trecho com atenção. Primeiro, porque não existe médium infalível. O que nos leva à
certeza de que não há comunicação isenta de falhas,
muito menos inquestionável. Segundo, porque se o melhor médium é o que tem sido
enganado menos vezes, como supor que exista algum “intocado” pelos Espíritos
inferiores? Por exemplo:
Justamente pelo valor da sua
história e da sua importância para o movimento espírita brasileiro e mundial, supor
ser o Chico Xavier perfeito e isento de falhas seria demonstrar ignorar os mais
básicos princípios do Espiritismo. Condenar uma análise crítica
feita sobre alguma das suas obras psicografadas seria ignorar as insistentes
recomendações feitas por Kardec e principalmente por São Luís quando afirma que:
“Por mais legítima confiança que vos inspirem os Espíritos há uma recomendação que nunca seria demais
repetir e que deveis ter sempre em mente ao vos entregardes aos estudos: a de
pesar e analisar, submetendo ao mais rigoroso controle da razão TODAS as
comunicações que receberdes; a de não negligenciar, desde que algo
vos pareça suspeito, duvidoso ou obscuro, de pedir as explicações necessárias
para formar a vossa opinião”.
A questão 10, do capítulo
supracitado é valiosíssima por afirmar que: “os Espíritos bons permite
que os melhores médiuns sejam às vezes enganados, para que exercitem o seu
julgamento e aprendam a discernir o verdadeiro do falso. Além
disso, por melhor que seja um médium, jamais é tão perfeito que não tenha um
lado fraco, pelo qual possa ser atacado. Isso deve servir-lhe de lição. As
comunicações falsas que recebe de quando em quando são advertências para
evitar que se julgue infalível e se torne orgulhoso. Porque o médium que recebe
as mais notáveis comunicações não pode se vangloriar mais do que o tocador de
realejo, que basta virar a manivela de seu instrumento para obter belas árias”.
É incrível observar que se a
maioria dos médiuns se propusesse a estudar esta magnífica obra de forma séria
e metódica, a prudência teria evitado que diversas obras de conteúdo
duvidoso tivessem sido publicadas, o que tornaria o movimento
espírita brasileiro muito mais sério, respeitado e livre dos pseudos sábios e
mistificadores que entravam a sua obra de emancipação de consciências.
Entretanto, por mais sublimes
e indispensáveis sejam estas informações, não são as únicas pérolas encontradas
neste capítulo. Existe ainda uma advertência de Erasto com relação às
comunicações repletas de “ideias heterodoxas”, espiriticamente falando,
que possam vir dos Espíritos e que poderiam ser insinuadas em meio às coisas
boas junto a fatos imaginados, asserções mentirosas, com tamanha habilidade que
poderiam enganar as pessoas de boa fé.
Ele ainda estimula a
eliminação sem piedade de toda palavra e toda frase equívoca, conservando-se
na comunicação somente o que a lógica aprova ou o que a doutrina já ensinou;
afirma que “onde a influência moral do médium se faz realmente sentir é
quando este substitui pelas suas ideias pessoais aquelas que os Espíritos se
esforçam por lhe sugerir. É quando ele tira da sua própria imaginação, as teorias
fantásticas que ele mesmo julga, de boa-fé (mas nem sempre), resultar de
uma comunicação intuitiva”. Erasto também alerta ser necessário aos dirigentes
espíritas possuírem um tato apurado e uma rara sagacidade para poder
discernir as comunicações verdadeiras e não ferir o amor próprio
daqueles que se permitem iludir com joias falsas.
É neste momento que ele nos
oferece um de seus mais famosos e importantes conselhos: Na
dúvida, abstém-te, diz um dos vossos provérbios. Não admitais, pois, o que não
for para vós de evidência inegável. Ao aparecer uma nova
opinião, por menos que vos pareça duvidosa, passai-a pelo crivo da razão e
da lógica. O que a razão e o bom senso reprovam rejeitai corajosamente. “MAIS
VALE REJEITAR DEZ VERDADES DO QUE ADMITIR UMA ÚNICA MENTIRA, UMA ÚNICA TEORIA
FALSA”.
Com efeito, sobre
essa teoria poderíeis edificar todo um sistema que desmoronaria ao primeiro
sopro da verdade, como um monumento construído sobre areia movediça.
Entretanto, se rejeitais hoje certas verdades, porque não estão para vós clara
e logicamente demonstradas, logo um fato chocante ou uma demonstração
irrefutável virá vos afirmar a sua autenticidade”.
Embora ela tenha se tornado
uma regra de ouro (a frase destacada em maiúsculo), conforme José Herculano
Pires afirmou, devendo ser constantemente observada nos trabalhos e estudos
espíritas, isolada do seu contexto ela perde a sua riqueza, o seu caráter
especial, ficando deslocada e nem sempre parecendo justa. Analisemos a sua
estrutura.
Primeiro reencontramos um
sábio provérbio: “na dúvida, abstém-te”. Pois quem nunca duvidou não pode
afirmar que encontrou a verdade, que adquiriu a convicção. O
codificador é um belo exemplo de como a dúvida, sem exageros, conduz à verdade. É
valiosíssimo o depoimento de Kardec encontrado em “Obras Póstumas”, onde
ele afirma que um dos primeiros resultados das suas observações foi saber que os
Espíritos nada mais são que as almas dos homens, possuindo conhecimentos
limitados à sua condição evolutiva e que por isto as suas
opiniões tinham o valor de uma opinião pessoal, nada mais.
Foi esta verdade,
compreendida desde o início, que o protegeu de acreditar ingenuamente na
infalibilidade dos Espíritos e de elaborar teorias prematuras com base nos
ditados de uns ou de alguns. Quantas teorias não são construídas dentro desta
perspectiva? Os vários corpos do perispírito, em gritante oposição ao conceito
formulado pelo codificador, a magia, as informações e afirmações sobre Física
Quântica relacionados com o Espiritismo são alguns exemplos de “teorias”
edificadas em informações pessoais dos Espíritos como se fossem absolutamente
verdadeiras.
Elas não foram observadas,
analisadas, criticadas, reavaliadas para serem aceitas como verdades
verificadas. Aqui é onde entra a importância da abstenção. Pois se não possuo a
firme convicção oriunda da análise sistemática, racional e eminentemente lógica
e da experiência, como posso supor que uma determinada informação é verdadeira?
Não podemos agir por achismos dentro do movimento espírita.
Em segundo lugar encontramos
a importância de passar toda opinião, por menos duvidosa que pareça, pelo crivo
da razão e da lógica. Como afirma Erasto: “é incontestável que, submetendo-se
ao cadinho da razão e da lógica todas as
observações sobre os Espíritos e todas as suas comunicações será fácil rejeitar
o absurdo e o erro”. As palavras destacadas dão um valor importantíssimo à citação.
Primeiro porque ressalta a
importância de que haja um exame severo sobre os Espíritos comunicantes e suas
comunicações. Segundo por que para Erasto, quem assim procede, não encontra dificuldades
em perceber a ponta da orelha do mentiroso, do pseudossábio, do fanfarrão. Até
porque estes Espíritos mistificadores podem, fingindo amor e
caridade, semear a desunião e retardar o progresso da humanidade e da Ciência
Espírita ao propagarem seus sistemas absurdos, muitas vezes com a
ajuda não só de médiuns imprevidentes, mas de casas espíritas que se julgam
privilegiadas, ou onde reinam a superstição e a falta de um estudo sistemático
da Codificação.
Não é à toa que Herculano
Pires escreve que a “confiança de Kardec na análise racional das
comunicações é acertada, mas depende do critério seguro de quem
analisa. Por isso mesmo é conveniente fazer a análise em conjunto e
recorrer, no caso de dúvida, a outras pessoas de reconhecido bom senso. O
Espírito farsante pode influir sobre um indivíduo e sobre um grupo, o que tem
ocorrido com frequência em virtude da vaidade, da pretensão ou do misticismo
dominante. Comunicações avulsas e até obras mediúnicas alentadas,
evidentemente falsas, têm sido publicadas, aceitas e até mesmo defendidas por
grupos e instituições diversas”.
Terceiro, após as
considerações expostas, compreendemos que o conselho de Erasto visa antes à prudência
que o exagero. E isto fica muito claro quando ele desenvolve seu raciocínio,
no fim deste parágrafo, ao afirmar que se hoje rejeitamos certas
verdades, pelo fato de não estarem devidamente comprovadas amanhã um fato
chocante poderá afirmar a sua autenticidade.
E este é o ponto chave da sua
afirmação, pois se não temos certeza de uma opinião, como podemos provar a
sua autenticidade? Por mais respeitável que seja o nome que subscreva a
comunicação, por mais atraente que seja uma teoria, só o tempo e uma
metodologia de pesquisa adequada poderão provar que ela está correta. É por
isto que não devemos ter medo de rejeitar uma ideia, sem, no entanto, ignorar
que ela pode, se for testada e averiguada, provar estar certa. Esta observação
é confirmada por Kardec da seguinte forma:
“Se é certo que a utopia de
hoje se torna muitas vezes a verdade de amanhã, deixemos que o futuro
realize a utopia de hoje, mas não enredemos a Doutrina com princípios, que
possam ser considerados quimeras e a tornem rejeitada pelos
homens positivos”.
Como pudemos ver nesta
sucinta análise, não é absurdo rejeitar dez verdades para não ter que aceitar
uma mentira porque não estão clara e logicamente demonstradas. E é justamente
por conselhos como estes, compreendidos em seu contexto, que
Kardec considerou Erasto um Espírito Superior, pois só um poderia ensinar tanto
com tão pouco. O estudo das suas mensagens deve ser obrigatório nas casas
espíritas. E diferente de outros “espíritos famosos” da atualidade, muito
verbosos e prolixos, com suas dezenas de perispíritos e magos, este sim é um
ilustre desconhecido que precisa ser redescoberto!
Compilado
de Analises espiritas blogspot.com.br