Nas Fronteiras da Loucura
Manoel P. de Miranda - Divaldo Pereira Franco
Centro Espírita Nosso Lar – Grupo de Estudos das obras
de André Luiz e de Manoel Philomeno de Miranda.
28. Origens do Carnaval
Prosseguia o Carnaval e a cidade, regurgitante, era um pandemônio. Multidão de Espíritos, que se misturava à mole humana em excitação dos sentidos físicos, dominava a paisagem sombria das avenidas, ruas e praças, cuja iluminação, embora feérica, não conseguia vencer a psicosfera carregada de vibrações de baixo teor.
Grupos mascarados eram acolitados por frenéticas massas de Espíritos voluptuosos, que se entregavam a desmandos e orgias lamentáveis, inconcebíveis do ponto de vista terreno. Algumas Entidades atacavam os burlescos transeuntes tentando prejudicá-los com suas induções nefastas. Outras buscavam as vítimas em potencial para alijá-las do equilíbrio, dando início a processos nefandos de obsessões demoradas.
A sucessão de cenas, deprimentes umas, selvagens outras, era constrangedora, o que mereceu de Dr. Bezerra o seguinte comentário: "Grande, expressiva faixa da humanidade terrena transita entre os limites do instinto e os pródromos da razão, mais sequiosos de sensações do que ansiosos pelas emoções superiores”. Natural que se permitam, nestes dias, os excessos que reprimem por todo o ano, sintonizados com Entidades que lhes são afins.
“É de lamentar, porém, que muitos se apresentam, nos dias normais, como discípulos de Jesus, preferindo, agora, Baco e os seus assessores de orgia ao Amigo Afetuoso". O Mentor referiu, então, que as origens do “Carnaval” se encontram na “bacanalia”, da Grécia, quando era homenageado o deus Dionísio. Mais tarde, essas festas apresentavam-se em Roma, como “saturnalia”, quando se imolava uma vítima humana, adredemente escolhida.
Depois, já na Idade Média, aceitava-se a tese de que "Uma vez por ano é lícito enlouquecer", o que tomou corpo, modernamente, no Carnaval de nossos dias. "Há estudiosos do comportamento e da psique, asseverou Dr. Bezerra, sinceramente convencidos da necessidade de descarregarem-se as tensões e recalques nesses dias em que “a carne nada vale”, cuja primeira sílaba de cada palavra compôs o verbete “carnaval”.
Sem dúvida, porém, a festa é vestígio da barbárie e do primitivismo ainda reinantes, e que um dia desaparecerão da Terra, quando a alegria pura, a jovialidade, a satisfação, o júbilo real substituírem as paixões do prazer violento e o homem houver despertado para a beleza, a arte, sem agressão nem promiscuidade." (Cap. 6, pp. 51 a 53)
29. No Carnaval, raros divertem-se
O Posto de Socorro Central localizava-se em Praça arborizada, no coração da grande metrópole, com diversos sobpostos espalhados em pontos diferentes, estrategicamente mais próximos dos lugares reservados aos grandes desfiles e às mais expressivas aglomerações de carnavalescos.
A equipe espiritual fora cuidadosamente preparada e se estabelecera que o socorro somente seria concedido a quem o solicitasse, ampliando-o a todas as vítimas que padecessem ultrajes e agressões, violências e tragédias. "De nossa parte, informou Manoel P. de Miranda, nenhuma insistência ou interferência indébita deveria ser assumida."
Perto do Posto Central a movimentação fazia-se maior. Benfeitores Espirituais atendiam pessoas encarnadas que, em parcial desprendimento pelo sono, rogavam ajuda para seus familiares inexperientes arrojados à folia enlouquecedora, assim como aos que se preocupavam com a alucinação de pessoas queridas que se desvincularam dos compromissos assumidos a fim de mais se atirarem no dédalo das paixões.
Eram atendidos também Espíritos que pretendiam volver à carne e pediam oportunidade, nos lances dos encontros irresponsáveis; desencarnados que rogavam apoio para pessoas amadas com problemas de saúde, e recém desencarnados em pugnas decorrentes da ingestão de alcoólicos, de desvarios sexuais e das interferências subjugadoras de seres obsidentes.
O local mais parecia uma praça de guerra, burlescamente apresentada, em que o ridículo e a dor se ajustavam em pantomina de aflição. Dr. Bezerra disse então ao seu amigo: "Não se creia que todos quantos desfilam nos carros do prazer, se encontrem em festa”.
Incontáveis têm a mente subjugada por problemas de que procuram fugir, usando o corredor enganoso que leva à loucura; diversos suicidam-se, propositalmente, pensando escapar às frustrações que os atormentam em longo curso; numerosos anseiam por alianças de felicidade que os momentos de sonho parecem prometer, despertando, depois, cansados e desiludidos.
Raros divertem-se, descontraem-se sadiamente, desde que os apelos fortes se dirigem à consunção de todas as reservas de dignidade e respeito nas fornalhas dos vícios e embriaguez dos sentidos. (Cap. 6, pp. 53 e 54)
30. Para Noel, o Carnaval é passado de dor
Silenciando e olhando em derredor, Dr. Bezerra comentou que é por isto que os imortais informaram a Kardec que "a Terra é um planeta de provas e expiações", onde programamos o crescimento para Deus. Saturado pelo sofrimento e cansado das experiências inditosas, asseverou o Benfeitor Espiritual, o homem, por fim, regenerar-se-á ao influxo da própria dor e sôfrego para fruir o amor que lhe lenificará as íntimas aspirações da alma.
Na seqüência, como Dr. Bezerra tinha diversos compromissos a resolver, Philomeno pôde ver, com surpresa, que entre os cooperadores do Posto Central se encontrava um célebre poeta e compositor, cujas músicas populares foram-lhe familiares quando na Terra. (Trata-se do notável compositor Noel Rosa.) O compositor, atendendo a uma pergunta de Philomeno, confessou-lhe haver buscado, em sua última existência na Terra, os alcoólicos e outras drogas, para compensar suas tristezas e tormentos.
A desencarnação colheu-lhe a vida física ainda jovem. "Despertei sob maior soma de amarguras, com fortes vinculações aos ambientes sórdidos, pelos quais transitara em largas aflições", contou ele, que se declarou mais um fracassado do que um infelicitador.
Embora eu não fosse um herói, nem mesmo um homem que se desincumbira corretamente do dever, a minha memória, disse o poeta da Vila, gerou simpatias e a mensagem das músicas provocou amizades, graças a cujo recurso fui alcançado pela Misericórdia Divina, que me recambiou para outros sítios de tratamento e renovação, onde despertei para realidades novas.
Começou aí uma nova vida para ele, que passou a compor outros sambas ao compasso do bem, com as melodias da esperança e os ritmos da paz, "numa Vila de amor infinito". "O Carnaval, para mim, é passado de dor e a caridade, hoje, é me festa de todo dia, qual primavera que surge após inverno demorado, sombrio", asseverou o compositor, acrescentando: "Apesar da noite vitoriosa, o dia de luz sempre triunfa e o bem soberano tudo conquista." (Cap. 6, pp. 55 e 56)
31. Saldos do Carnaval
A área reservada ao Posto Central correspondia quase à Praça inteira. Antes de serem instaladas as dependências que abrigariam os pacientes espirituais naqueles dias, engenheiros do plano espiritual haviam tomado providências defensivas, para que o ministério da caridade não sofresse danos decorrentes das invasões de Espíritos perniciosos.
Como não há improviso nas tarefas superiores, estabeleceram-se planos e traçaram-se diretrizes para a construção do “Núcleo transitório”. Substância “ectoplásmica”, retirada das pessoas residentes nas cercanias, como da Natureza, foi movimentada para a “edificação do conjunto e das muralhas defensivas” que renteavam, internamente, com as grades protetoras do parque. Duas largas entradas, opostas entre si, permitiam a movimentação das Entidades.
“Voluntários adestrados e pré-munidos de recursos magnéticos faziam a vigilância nos portões de acesso” e em torno da construção. Amplos barracões, semelhantes a tendas revestidas de lona, espalhavam-se pelo recinto. Camas colocadas em filas duplas recebiam os desencarnados enfermos, que foram arrebanhados nos três últimos dias, antes de serem transferidos para colônias espirituais.
Desde o sábado, as ocorrências inditosas tomaram corpo mais volumoso: homicídios tresvariados, suicídios alucinados, paradas cardíacas por excesso de movimento e exaustão de forças, mortes por abuso de drogas ofereciam um índice elevado de vítimas de si mesmas, pela imprevidência, nos dias tormentosos da patuscada irrefreável. Além desses, diversos encarnados em transe demorado, recebiam socorro de urgência antes de retomarem seus corpos em Hospitais ou nos lares. (Cap. 7, pp. 57 e 58)
“A publicação do estudo continuará
nas próximas semanas”