No jornal o Estado de Minas datado de
13.06.1999, na coluna Testemunho Cristão, um consulente pergunta: Tenho lido a Bíblia à procura de ao menos uma frase que
seja contra a reencarnação, etc., cuja resposta da
articulista foi: Entre numerosas evidências, de que são fartas as páginas
sagradas, cito-lhe duas muito incisivas e fortes.
"A nossa vida é a passagem duma
sombra e não há
regresso depois da morte, porque é posto o selo e ninguém torna". Na carta de S. Paulo aos hebreus,
lemos: "E assim como está decretado que os homens morram “uma só vez”, e que depois disso se siga o julgamento, assim também Cristo se
ofereceu uma só vez".
Como queremos saber o que pensam outros
segmentos religiosos temos por hábito de, sempre que possível, ler esta coluna.
Desta vez o tema
chamou-nos a atenção e achamos que deveríamos pesquisar na Bíblia as passagens
citadas.
Interessante como “pegam frases isoladas de um texto para tentar justificar suas
posições, sem levar em conta o contexto em que elas se encontram”. O que é grave nisto é que aos que não têm o hábito de verificar em
qual contexto a passagem se encontra, acabam se convencendo de que aquilo é uma verdade, pois, geralmente, têm a Bíblia como infalível, não se preocupam de
eles mesmos irem de encontro à verdade, simplesmente aceitam os pensamentos que
lhe são passados pelos outros.
A primeira passagem que citam como prova
de que não existe a reencarnação inicia-se assim; “Dizem, com efeito, nos seus falsos raciocínios: Curta é a nossa vida e
cheia de tristezas, para a morte não há remédio. Não há notícia de ninguém que tenha voltado da região dos
mortos.
Um belo dia
nascemos, e depois disso, seremos como jamais
tivéssemos sido! É fumaça a
respiração de nossos narizes, e nosso pensamento uma centelha que salta do
bater de nosso coração!
Extinta ela, nosso corpo se tornará pó e o nosso espírito se dissipará como
vapor inconsistente! E ninguém se lembrará de nossas obras. Nossa vida passará como os traços de
uma nuvem, desvanecer-se-á como uma névoa que os raios de sol expulsam, e que
seu calor dissipa”.
A partir daí, sim é que temos o
versículo 5: “A passagem de uma sombra. Eis a nossa vida, e nenhum reinício é
possível uma vez chegado o fim; porque o selo lhe é aposto e ninguém volta”. Continuando até o versículo 20, onde o autor do livro mostra o que
pensam os ímpios.
Voltemos à narrativa, agora nos
versículos 21-23: "Eis o que pensam, mas enganam-se, sua malícia os cega:
eles desconhecem os segredos de Deus, não esperam
que a santidade será recompensada e não acreditam na glorificação das almas
puras. Ora, Deus criou o homem para a
imortalidade e o fez à imagem de sua própria natureza."
Já vemos neste texto, de absoluta
clareza, que “não se trata de contradizer a
tese da reencarnação, mas sim é mostrado de que maneira os ímpios pensavam
sobre vida além túmulo”, não acreditavam que depois da morte pudesse existir alguma coisa,
para eles era o nada.
Constatamos, assim, que “este texto não tem nada que possamos tirar como
contestação da reencarnação”, ficando, portanto, derrubado o primeiro
argumento.
Vamos agora ao texto de S. Paulo, em
Hebreus 9, 27, mas antes devemos saber que é retirado de parte da carta enviada
aos hebreus, onde ele tenta mostrar que o sangue oferecido nos sacrifícios
não pode apagar nossos pecados e que Cristo ao dar
seu sangue, na cruz, pagou os nossos vários pecados. Aí completa:
"Como está determinado que os homens morram
uma só vez, e logo em seguida vem o juízo, assim Cristo se ofereceu uma só vez
para tomar sobre si os pecados da multidão, e aparecerá uma segunda vez, não,
porém, em razão do pecado, mas para trazer a salvação àqueles que o esperam."
Devemos sempre ter em mente que na
Bíblia não consta tudo e nem toda a ciência ali está, o próprio Jesus disse: que tinha muitas coisas para
dizer, mas como os apóstolos ainda não eram capazes de compreender, não iria
dizer.
Por outro lado não devemos tomar como leis
as opiniões pessoais dos apóstolos, pois seus
pensamentos representam sempre o contexto cultural da época em que viveram.
Dito isto, vamos verificar que se
realmente fosse dado ao homem morrer uma só vez, as ressurreições constantes do Evangelho ( Mateus 9, 18-26; Lucas 7, 11-17 e João 11, 1-44, da filha de
Jairo, do filho da viúva de Naim e de Lázaro, respectivamente) seriam uma contradição a esta
Lei, pois, nestes casos, estas pessoas que voltaram à vida tiveram duas mortes,
ou não?
Ainda mais, se logo em seguida vem o
julgamento. Não vemos nenhum sentido no juízo final (pensamento deles), pois seríamos julgados duas
vezes. Se realmente houvessem dois julgamentos estaríamos diante de uma
aberração da justiça divina, pois valeria dizer
que um não foi perfeito, o que eqüivaleria dizer que Deus não agiu com
perfeição, o que é um absurdo.
Na hipótese do espírito ser condenado ao "fogo eterno" no
primeiro julgamento seria possível que no segundo julgamento ele fosse
absolvido, ora se isto acontecer fica evidente que
ele foi condenado injustamente. Vemos nisto só incoerência, assim não podemos,
seguindo a linha de raciocínio deles, aceitar os dois julgamentos.
Por outro lado, na nossa percepção do
texto, partindo para a essência, “podemos afirmar que Paulo tem a mais completa razão, ou seja,
neste corpo que ora habitamos morremos mesmo uma só vez” e o julgamento de nossos atos será realizado em seguida, e ainda
mais, teremos sempre um novo julgamento após cada desencarne.
Como já dissemos “pregam os textos conforme suas conveniências”, muitos dos quais se mostram incoerentes
com outras passagens do Evangelho.
Vejamos por exemplo: "Porque
sabemos que, quando for dissolvido este corpo, nossa habitação aqui na terra, receberemos de Deus uma
habitação, uma moradia eterna nos céus, que não é feita pela mão humana. Por isso é que suspiramos nesta nossa
situação, ansiosos por revestir-nos do nosso
corpo celeste: sob a
condição, porém, de sermos encontrados ainda vestidos e não despidos." (2 Cor 5, 1-3).
Este texto é do mesmo Paulo que foi citado como base contra a
reencarnação, entretanto ele é frontalmente contra a tese da ressurreição da
carne, um de seus principais dogmas. Aqui ele mostra que
temos um corpo celeste e é ele que teremos após nossa morte, quanto ao corpo
físico ele será dissolvido.
Agora nós é que procuraremos demonstrar
o contrário, ou seja, que a reencarnação fazia parte da
cultura do povo hebreu e, principalmente dos ensinos de Jesus.
Teremos para isto que buscar algumas
passagens do Novo Testamento que irão nos dar elementos de convicção.
"Quando
ele ia passando, viu um homem que era cego de
nascença. Os discípulos perguntaram: "Mestre, quem pecou, para este homem
nascer cego, foi ele ou seus pais?" Jesus respondeu: "Nem ele nem seus pais, mas isso aconteceu para
que as obras de Deus se manifestem nele." (João. 9, 1-3)
Como um cego de nascença poderia ter
pecado? Se a
cegueira fosse "castigo de Deus" pelos pecados daquele homem, onde
estaria seu pecado, pois era cego desde quando veio ao
mundo. Para ter lógica, somente poderia ter cometido suas faltas em existências
anteriores. Fato que os discípulos acreditavam,
pois só assim justificaríamos a pergunta deles a Jesus: "Quem pecou, para
este homem ter nascido cego, foi ele ou seus pais?
Diante do princípio "a cada um segundo suas obras" (Mateus 16, 27), no dizer do Mestre, ninguém paga pelo erro do outro, ficando a responsabilidade dos
atos atribuída às próprias pessoas que os praticam.
A resposta de Jesus: Nem ele nem seus
pais, mas isso aconteceu para que as obras de Deus se manifestem nele, poderá
ser explicada da seguinte forma: diante de tanta ignorância e atraso espiritual daquele povo,
havia a necessidade de Jesus fazer alguns "milagres", como os fez, no sentido de despertar as criaturas para as verdades do Pai.
Assim, com Jesus encarnaram vários
espíritos que vieram com a tarefa de auxiliá-lo em sua missão e este homem cego era um
deles. Os que escolheu como apóstolos largaram tudo para seguí-lo,
atendendo ao seu chamado, que funcionou como lembrete do compromisso que assumiram, quando estavam no plano espiritual.
"Tendo
chegado à região de Cesaréia de Felipe, Jesus perguntou aos discípulos: "Quem dizem por aí as pessoas que é o filho do homem?" Responderam: "Umas dizem que é João Batista, outras que é Elias,
outras, enfim, que é Jeremias ou algum dos profetas." (Mateus 16, 13-14; Lucas 9, 18-19; Marcos 8, 27-28)
O povo também acreditava que uma pessoa que já morreu poderia
voltar. Ao dizerem que Jesus seria João Batista, Elias, Jeremias ou
alguns dos profetas confirmam este entendimento, pois todos eles já haviam morrido, inclusive, destes, somente João Batista foi contemporâneo de
Jesus, entretanto à época desta narrativa já tinha sido morto por Herodes.
"Nesse
ínterim, Herodes, o Tetrarca, ouvia falar de tudo o que fazia Jesus e seu
espírito se achava em suspenso – porque uns diziam
que João Batista ressuscitou dentre os mortos; outros que aparecera Elias; e
outros que um dos antigos profetas ressuscitara. – Disse então Herodes: "Mandei
cortar a cabeça de João Batista; quem é então esse de quem ouço dizer tão
grandes coisas? E ardia por vê-lo." (Marcos 6, 14-16 e Lucas 9, 7-9)
Nesta passagem encontramos novamente o
pensamento do povo a respeito de Jesus, entretanto, desta podemos tirar, sem nenhuma sombra de dúvida, que
naquele tempo o conceito de ressurreição é o que hoje chamamos de reencarnação. Conforme o texto Jesus, no pensamento do povo, poderia ser João
Batista ou mesmo um dos antigos profetas ressuscitado, o que significa em linguagem
clara é que pensavam mesmo é na possibilidade de Jesus ser alguém que viveu
anteriormente reencarnado.
"Havia
entre os fariseus um, chamado Nicodemos, dos mais importantes entre os judeus.
Ele foi encontrar-se com Jesus à noite e lhe disse: "Rabi, bem sabemos que és um Mestre enviado por Deus, pois ninguém seria capaz de fazer os sinais que tu fazes, se Deus não
estivesse com ele."
Jesus
respondeu: "Eu te afirmo e esta é a verdade: ninguém verá o reino de Deus se não nascer de novo". Disse-lhe Nicodemos: "Como pode nascer um homem já velho? Pode
tornar a entrar no ventre de sua mãe, para nascer segunda vez?" Jesus
respondeu: "Eu vos afirmo e esta é a verdade: se alguém não nascer da água e do Espírito, não poderá entrar no
Reino de Deus. O que nasce da carne é carne; o que nasce do Espírito é
espírito. Não te
admires do que eu disse: é necessário para vós nascer de novo. O vento sopra
para onde quer e ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem aonde vai. Assim
é quem nasceu do Espírito." (João. 3, 1-8)
Antes de nossa argumentação vamos ver o
que consta em Atos 23, 8: "É que os
saduceus dizem que não há ressurreição, nem anjos, nem espíritos, enquanto que
os fariseus admitem todas estas coisas." Nicodemos era um fariseu, portanto, conforme deduzimos deste texto
ele acreditava na ressurreição, que conforme mostramos anteriormente,
corresponderia dizer que ele acreditava na reencarnação.
Observemos que Nicodemos entendeu o que
Jesus quis dizer com o "nascer de novo" a dúvida que lhe ficou era:
como isto poderia acontecer. Razão de suas
perguntas: Como pode nascer um homem já velho? Pode voltar ao ventre de sua mãe
e nascer segunda vez? Separa distintamente o corpo físico do elemento espiritual, o que nasce da carne é carne, o
que nasce do espírito é espírito.
Algumas correntes religiosas buscam
sustentar que o nascer da água significa nascer de novo pela água do batismo.
Entretanto, o sentido, na época, da palavra água é bem outro. Sabemos que 2/3 da Terra é composto de água, e que sem água não
haveria vida material em nosso planeta. Assim
o elemento água é
a base para a manifestação da vida material, aí incluindo, é claro, nosso corpo
físico.
Além do mais no período de nossa
gestação, ficamos
por nove meses dentro d’água, no útero de nossa mãe. Donde concluímos que, neste sentido, literalmente nascemos da
água, não acham?
Quanto à questão do batismo, no Evangelho só encontramos
João Batista utilizando da prática do batismo, não como um rito de iniciação ou para
nos livrarmos do pecado original, mas somente batizava as pessoas que se
arrependiam de seus pecados, era portanto o batismo do arrependimento.
Tanto é que os fariseus e saduceus o procuraram para serem batizados,
ele negou-se a fazê-lo dizendo: "Raça de
víboras, quem vos sugeriu escapardes da cólera que está chegando? Portanto,
produzi frutos que sejam o testemunho da vossa conversão, sem presumirdes que
vos basta dizer dentro de vós: "Temos por pai a Abraão." (Mateus 3, 7-9)
Mais ainda, se realmente o batismo fosse
algo importante a ser feito, porque é que Jesus não batizou ninguém? Não seria o caso de dar-nos este exemplo?
Bem voltemos ao nosso assunto principal,
veremos agora o
próprio Jesus confirmar a reencarnação, fato que não combateu, quando do questionamento dos discípulos acerca do cego de nascença
e a respeito de quem as pessoas pensavam que ele era.
No Antigo Testamento, o profeta
Malaquias (3, 23) anuncia a volta de Elias: "Vou mandar-vos o profeta Elias, antes que venha o grande e
terrível dia do Senhor, e
ele converterá o coração dos pais para os filhos, e o coração dos filhos para
os pais, de sorte que não ferirei mais de interdito a Terra". A volta é de Elias e não como querem dar ao termo Elias a conotação de que quer
dizer Messias ou Mensageiro.
Em Lucas l, 11-14, encontraremos o
anúncio da chegada de Elias: "Mas
o anjo lhe disse: "Não tenhas medo, Zacarias, porque tua oração foi
ouvida: tua esposa Isabel vai te dar um filho e lhe porás o nome de João.
E continuando no versículo 17: "Ele o precederá com o
espírito e o poder de Elias, para reconduzir o coração dos pais aos filhos, bem
como os rebeldes aos sentimentos dos justos. Vai preparar assim para o Senhor,
um povo bem disposto."
Se João estaria com o espírito e o poder
de Elias, conclusão
lógica que João era o próprio Elias reencarnado.
E finalmente a confirmação que João
Batista era o Elias: "Os
discípulos lhe perguntaram: "Por que dizem os escribas, que Elias deve vir
antes?" Respondeu-lhes: "Elias há de
vir para restabelecer todas as coisas. Mas eu vos digo que Elias já veio e não
o reconheceram, mas fizeram com ele o que quiseram. Do mesmo modo, também o filho do homem
está para sofrer da parte deles. Então, os discípulos compreenderam que Jesus
lhes tinha falado a respeito de João Batista." (Mateus 17, 10-13; Marcos
9. 11-13)
Não foi Elias reconhecido por estar
reencarnado como João. Se fosse o contrário Jesus não deixaria que seus
discípulos continuassem pensando que João era o Elias, pois em várias passagens
demonstrou conhecer os pensamentos mais íntimos das pessoas.
E para que não restasse dúvida alguma
quanto a isso, vem ele próprio dizer: "E, se quiserdes compreendê-los, João é o Elias que estava
para vir. Quem tiver ouvidos, que escute bem." (Mateus 11, 14-15)
Aqui fica bem clara e taxativa a
reencarnação, pois é da boca do próprio Jesus que sai a afirmativa de João ser
o Elias que estava para vir antes dele, afim de preparar-lhe o caminho. E como sabia que ainda os homens não
teriam o completo entendimento de que Jesus falava da reencarnação acrescenta: "Quem tiver
ouvidos, que escute bem."
Fonte.: Paulo Neto (MG)