Bem aventurados os misericordiosos

Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles
alcançarão misericórdia. (Mateus, 5:7.) - Rodolfo Calligaris

Ser misericordioso é compadecer-nos da miséria alheia. Seja da miséria material, nas formas da indigência, do abandono ou da enfermidade, seja da miséria espiritual, caracterizada pelas mil e uma facetas da imperfeição humana.

Ser misericordioso é, pois,
condoer-nos desses párias molambentos, sem eira nem beira, que se arrastam pelo mundo, suplicando uma côdea de pão para "encostar" o estômago, ou um trapo usado com que cubram sua nudez, socorrendo-os com solicitude.

É apiedar-nos das crianças órfãs ou abandonadas, interessando-nos pela sua sorte e contribuindo, como e quanto nos seja possível, para que tenham um lar que as eduque e prepare para serem úteis a si mesmas e à sociedade, assim como olharmos pelos velhinhos desamparados, oferecendo-lhes um abrigo onde possam aguardar, serenamente, que a morte venha Libertá-los das vicissitudes terrenas.

É sensibilizar-nos à vista desses desgraçados aos quais a lepra, o pênfigo, o câncer, a sífilis, a tuberculose, etc., hão flagelado e reduzido à ruína, cujas existências se constituem numa sucessão ininterrupta de dores, angústias e melancolia, ajudando a minorá-las com os recursos de nossa bolsa e, melhor ainda, com o bálsamo de nossa simpatia, das palavras de conforto e encorajamento, das preces e vibrações que façamos em seu benefício.

Ser misericordioso é, acima de tudo,
suportarmos cristãmente os defeitos daqueles que nos rodeiam, relevarmos os agravos que nos façam, renunciarmos a todo e qualquer propósito de vingança, não guardarmos ressentimento de coisa alguma e estarmos sempre prontos a servir, seja lá a quem for, embora saibamos de antemão que ninguém nos será grato e talvez nem sequer nos compreenda o gesto fraternal e amigo.

Jesus Cristo considera bem-aventurados os que usam de misericórdia, porque,
segundo a Lei, "cada um recebe exatamente o que dá". Espíritos insipientes que somos, ainda no começo de nossa evolução, estamos, por isso mesmo, muito sujeitos ao erro.

Destarte, se não formos solidários com os que passam por duras provas e expiações, nem formos tolerantes com as fraquezas e imperfeições do próximo, também não teremos quem nos ajude a vencer os obstáculos de nossa jornada, assim como nossas próprias culpas e mazelas não serão toleradas pela Justiça Divina; e isso não por ''castigo", mas para que todos aprendamos a regra áurea, habituando-nos a "fazer aos outros aquilo que gostaríamos que nos fizessem".

Ninguém se iluda a esse respeito, supondo que um arrependimento de última hora,
ou os recursos oferecidos pela sua religião, sejam suficientes para granjear-lhe a graça de Deus e assegurar-lhe "um bom lugar" nas moradas celestiais.

Através do "Pai Nosso", suplicamos diariamente ao Altíssimo que
"perdoe as nossas ofensas, assim como perdoamos aos nossos ofensores". Pois bem: valorizemos nossas orações, traduzindo em atos tão sublimes palavras, perdoando, de fato, àqueles que de alguma forma nos tenham ofendido ou prejudicado.

Levemos-lhe, simultaneamente com
o nosso perdão, completo e sincero, também o amor, esse sentimento puríssimo que "cobre a multidão dos pecados"; só assim, mas só assim, inscrever-nos-emos entre aqueles a quem Jesus se referia, ao sentenciar: "Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia."