Geena é a transliteração
comum para o português de um termo de origem grega: “Géena”. Por sua vez, “Géena”
origina-se do termo hebraico “Geh Hinnóm” que significa literalmente “Vale de
Hinom”, e
que veio a tornar-se um depósito fora de Jerusalém onde o lixo era incinerado.
Agora o
vale é conhecido como “Uádi er-Rababi”. Esta palavra grega surge doze vezes no
texto bíblico, nos seguintes locais: Mateus (5:22, 29, 30; 10:28; 18:9; 23:15,
33), em Marcos ( 9:43, 45, 47), em Lucas (12:5) e em Tiago (3:6).
Geena
refere-se ao “vale de Hinom”, fora das muralhas de Jerusalém. Este vale era
usado
como “depósito de lixo”, onde se lançavam os “cadáveres de pessoas que eram
consideradas indignas”, restos de animais, e toda outra espécie de imundície. Usava-se enxofre para
manter o fogo acesso e queimar o lixo.
É também
referido no Antigo Testamento pelas seguintes expressões: O “vale do(s) filho(s)
de Hinom ou Ben-Enom”, ou simplesmente o “Vale”, como na expressão “Portão do
Vale” (Josué 15:8; 2 Reis 23:10; Neemias 3:13. É provável que a menção de “o vale dos cadáveres
e das cinzas” em Jeremias 31:40 (BJ) também se refira a este local.
1. - Localização geográfica
O “vale de Hinom” encontrava-se ao Sudoeste e ao Sul da antiga Jerusalém. (Josué 15:8; 18:16; Jeremias 19:2, 6). O vale estende-se para o Sul desde
as imediações do actual “Portão de Jaffa”, conhecido em árabe por
“Bab-el-Khalil”, vira abruptamente para o Leste no canto Sudoeste da cidade, e
segue ao longo do lado Sul ao encontro dos “vales
de Tiropeom e do Cédron”, num ponto perto do canto
Sudeste da cidade.
Numa zona um pouco acima do local onde
este vale converge com os “vales do Tiropeom e do
Cédron”, existe uma área mais larga. Provavelmente era aqui a localização de “Tofete”
(também grafado Tofet ou Tofeth, conforme as traduções), mencionado em 2 Reis
23:10.
No lado Sul do vale, perto da sua
extremidade oriental, encontra-se o lugar tradicional de “Acéldama ou Hacéldama ou Campo de Sangue”, o
campo do oleiro comprado com as 30 moedas de prata de Judas. (Mateus 27:3-10;
Atos 1:18, 19). Mais para cima, o vale é bastante estreito e fundo, com muitas
“câmaras sepulcrais” nos socalcos dos seus penhascos.
O “vale de Hinom” fazia parte da fronteira entre as “Tribos de Judá e de Benjamim”, encontrando-se o território de Judá ao Sul, o que situava Jerusalém no território de Benjamim,
conforme delineado em Josué 15:1, 8; 18:11, 16. O vale é agora conhecido como
uádi er-Rababi (Ge Ben Hinnom).
2. - Utilização do local
Durante o reinado de “Acaz”, rei de Judá, a “Geena” é
mencionada como tendo sido usada para a prática de
“rituais de sacrifício humano” em adoração a deuses das nações vizinhas,
particularmente a “Moloque” (também grafado Moloc ou
Moloch, conforme as traduções). Segundo mencionado em 2 Crónicas 28:1-3 era
neste vale que tais práticas, que incluíam o
“sacrifício de crianças”, eram realizadas.
“Acaz” subiu ao trono com vinte anos.
E reinou dezesseis anos em
Jerusalém. Não fez, como seu antepassado “Davi”, o que Javé
aprova. Imitou o comportamento dos “Reis de Israel”,
fazendo estátuas para os ídolos. Queimou incenso no vale dos Filhos de Enom e
“chegou até a sacrificar seus filhos no fogo”,
conforme os “costumes abomináveis das nações que Javé tinha expulsado diante
dos israelitas”.
O neto
de “Acaz”, o “Rei Manassés”, promovendo este tipo de prática degradante em
grande escala, também veio a fazer “os seus próprios filhos passarem pelo fogo
no vale do filho de Hinom”, conforme 2 Crónicas 33:1, 6, 9. O “Rei Josias”, neto
de “Manassés”, finalmente acabou com esta prática por profanar este lugar,
especialmente em “Tofete”, tornando-o impróprio para a adoração, talvez por espalhar
ali ossos ou lixo, conforme 2 Reis 23:10 que informa: Também profanou a
“Tofeth”, que está no “vale dos filhos de Hinom”, para que “ninguém fizesse
passar a seu filho, ou sua filha, pelo fogo a Moloch”.
Comentando este versículo, o erudito
judeu “David Kimhi (1160-1235)” diz o seguinte como possível explicação sobre
Tofete: Nome do lugar em que eles “faziam seus
filhos passarem pelo fogo para Moloque”. O nome do lugar era
“Tofete”, e diziam que era chamado assim porque eles
“dançavam e tocavam pandeiros” (tuppím) por ocasião da
adoração, para que “o pai não escutasse os gritos do filho quando o estivessem
fazendo passar pelo fogo”, e para que seu coração não ficasse agitado e ele o
tirasse das mãos deles.
E esse lugar era um vale que “pertencia a um homem
chamado Hinom”, de modo que era chamado de “Vale de Hinom e de Vale do Filho de
Hinom”. E Josias conspurcou aquele lugar,
reduzindo-o a um lugar impuro, para nele se lançarem
carcaças e toda impureza, a fim de que nunca mais subisse ao coração do homem
fazer seu filho ou sua filha passar pelo fogo para Moloque. (Biblia Rabbinica, Jerusalém, 1972).
Segundo nota de rodapé na Bíblia
Sagrada, da Difusora Bíblica Franciscanos Capuchinhos, o termo “Tofete” pode significar “Queimador”.
Com o tempo, o “vale de Hinom
tornou-se o depósito e incinerador do lixo de Jerusalém”. Lançavam-se ali “cadáveres de animais” para serem consumidos
pelos fogos, aos quais se acrescentava enxofre para ajudar na queima. Também se
lançavam ali os “cadáveres de criminosos executados”, considerados imerecedores dum sepultamento decente num túmulo memorial.
Quando esses cadáveres caíam no fogo,
então eram consumidos por ele, mas, “quando os cadáveres
caíam sobre uma saliência da ravina funda”,
sua carne em putrefacção ficava infestada de vermes, ou gusanos, que não
morriam até terem consumido as partes carnais, deixando somente os esqueletos. Nenhum animal ou criatura humana vivos eram lançados na “Geena”, para serem queimados vivos ou atormentados.
Tornou-se o depósito de lixo comum da cidade, onde se
lançavam os “cadáveres de criminosos, e as carcaças de
animais, e toda outra espécie de imundície”. (Smith’s Dictionary of the Bible
(Boston, 1889, Vol. 1, p. 879.). O Novo
Comentário Bíblico, na página 779, em inglês, diz: “Geena” era a forma
helenizada do nome do vale de Hinom em Jerusalém, no qual se mantinham
constantemente fogos acesos para consumir o lixo da cidade. Este é um poderoso
quadro da destruição final.
Visto que alguns “Israelitas sacrificavam ali seus filhos
a Moloque”, o vale veio a ser considerado como lugar de abominação. Num período posterior foi transformado num
lugar onde se jogava o lixo, e perpetuavam-se os fogos para impedir uma
pestilência. The New Funk &
Wagnalls Encyclopedia (Nova Iorque, 1950, Vol. 15, p.
5576).
3. - Traduções bíblicas vertem a palavra Geena
Alguns têm associado a palavra “Hades”
com a palavra “Geena”. No entanto, pelo exposto acima,
conclui-se que as duas expressões referem-se a coisas distintas. Algumas traduções tomaram a liberdade de traduzir
“Geena por Inferno”, conduzindo assim à ideia de um lugar
de tormento ardente. Alguns exemplos são:
Bíblia
Pastoral: Verte (Fazer versão ou
tradução) 11 vezes por inferno e uma vez translitera geena em Tiago 3:6. Almeida: Traduz as doze ocorrências por
inferno. Padre António Pereira de
Figueiredo: Traduz as doze ocorrências por inferno. Bíblia Sagrada, da Difusora Bíblica
Franciscanos Capuchinhos: Verte 10 vezes por Geena e 2 por Inferno em
Mateus 23:15 e Tiago 3:6
No entanto, algumas versões modernas, aprovadas pelo Catolicismo, Protestantismo e
outras denominações cristãs, como as Testemunhas de Jeová,
optaram coerentemente por usar nas doze ocorrências a transliteração Geena (É a
tradução de algo que não tem tradução para alguma outra língua.)
4.
- Conceito do Catolicismo e Protestantismo
Tendo sido traduzido algumas vezes como “Inferno”, o termo “Geena” acabou por ser conotado com
um lugar de tortura, de intensos sofrimentos, para
onde são conduzidas as almas dos pecadores impenitentes, após a morte do corpo
físico.
O conceito das “Testemunhas de Jeová”
sobre “Geena” é radicalmente oposto à da maioria das
religiões ditas cristãs, como também o conceito
mais convincente e moderado. Em harmonia com o que consideram ser a evidência
bíblica, “Geena ou o Vale de Hinom” pode servir
apropriadamente de símbolo de destruição, mas não de ardente tormento
consciente.
As Testemunhas de Jeová, argumentam
que “Jeová sendo um Deus de amor” jamais iria
condenar a uma eternidade de sofrimento quem foi pecador apenas por algumas
décadas. Afirmam ainda que, “quando os israelitas
queimavam seus filhos vivos, naquele vale”, Deus disse que algo tão horrível
nunca lhe subira ao coração, conforme Jeremias 7:30-31:
Pois os filhos de Judá fizeram
o que é mau aos meus olhos, é a pronunciação de Jeová. Colocaram as suas coisas
repugnantes na casa sobre a qual se invocou meu nome, para a aviltarem. E
construíram os altos de “Tofete”, que está no “vale do filho de Hinom, para queimarem no fogo a seus filhos e suas
filhas”, coisa que eu não havia ordenado e que não me havia subido ao coração.
Referem ainda as palavras do “apóstolo
Paulo” que, ao escrever aos cristãos em “Tessalónica”, disse que aqueles que
lhes causavam tribulação seriam “submetidos à punição
judicial da destruição eterna de diante do Senhor e da glória da sua força”.
“2 Tessalonicenses 1:6-9: Consideram
assim que a evidência bíblica torna claro que os que Deus julga indignos de merecer a vida não sofrerão tormento eterno
num fogo literal, mas sim a “destruição eterna”.
Não serão preservados vivos em parte alguma. “O fogo da Geena”, portanto, é
somente símbolo da totalidade e inteireza desta destruição.
Equiparam a palavra “Geena” com a
expressão “lago de fogo” que surge em Revelação ou
Apocalipse. Segundo os seus ensinos, “o lago de fogo” não significa um lugar de
tormento consciente, mas, antes, a morte ou destruição
eterna. Citam a própria Bíblia em Revelação 20:14: “E a morte e o Hades foram lançados no lago
de fogo. Este significa a
segunda morte, o lago de fogo”.
Para estas denominações religiosas é
evidente que este “lago é simbólico”, porque a Morte e o Inferno ou Hades, a
sepultura comum ou geral dos humanos, são lançados nele. Nem a morte nem o
inferno podem ser queimados literalmente. Mas podem ser eliminados ou destruídos definitivamente.
Referem que em Mateus 10:28, Jesus
avisou seus ouvintes a “temer aquele que pode destruir na
Geena tanto a alma como o corpo”. Lembram que não se faz
ali menção de tormento no fogo da Geena mas, antes, destruir na Geena. De modo
que concluem que as referências à “Geena de fogo” têm o mesmo significado que o
“lago de fogo”, de Revelação 21:8, ou seja, a destruição, “a segunda morte”, da qual não há ressurreição ou retorno.
O
derradeiro lugar de punição, evidentemente, é a “Geena, o Vale de Hinom”, que
antigamente fora um lugar onde se ofereciam sacrifícios humanos a deuses
pagãos, mas em tempos bíblicos já se havia tornado o depósito de lixo da
cidade, um “monturo” à beira de Jerusalém. O mau cheiro, a fumaça e o fogo eram ali um
lembrete constante, para os habitantes, do que acontecia às coisas que haviam
servido ao seu fim, eram destruídas.
Este vale é mencionado, não
por nome, em Isaías 66:24, como local em que “os cadáveres de rebeldes contra Yahweh devem
jazer”. Na literatura
rabínica, porém, o fogo eterno não é certamente punição eterna. A Geena é um lugar em que os iníquos são
destruídos de corpo e alma, o que talvez reflita a idéia de aniquilação (Mt 10:28).
5.
- O Conceito do Judaísmo
O conceito rabínico, judaico, segundo
impresso em The Jewish Encyclopedia
(Enciclopédia Judaica), reza como segue: No dia de
julgamento final, haverá três classes de almas: “as
dos justos” serão imediatamente inscritas para a vida eterna; “as dos iníquos,
para a Geena”; mas as daqueles “cujas virtudes e pecados se equilibrarem
baixarão à Geena, e flutuarão para cima e para baixo até que se ergam,
purificados”.