Seminário sobre o Perdão – Divaldo Pereira Franco
Compilado por José Argemiro da Silveira
“Se
perdoardes aos homens as ofensas que vos fazem, também vosso Pai celestial vos
perdoará os vossos pecados. Mas se não perdoardes aos homens, tampouco vosso
Pai vos perdoará os vossos pecados". (Mateus, VI: 14-15)
O perdão na visão da Psicologia profunda é dar o direito de cada um ser como é. E também a nós o direito de sermos como somos. Se o próximo é assim, não nos cabe modificá-lo, mas se estou assim, tenho o dever de modificar-me para melhor.
Toda vez
que fico com raiva a pessoa está me manipulando, e eu não deixo ninguém me
manipular. Não
posso permitir que um desequilibrado me oriente. Sou eu a pessoa saudável; não devo dar a ele a
importância que se atribui. Devo olhá-lo como um terapeuta olha um doente.
Se tenho
uma visão diferente da vida, e se desejo transmitir esta visão, é nobre; mas
não posso esperar que o outro a acate, porque ele está em outro nível de
evolução. Devo
dar o direito ao outro de ser inferior, se isto lhe agrade.
Se
achamos que ele nos ofendeu, a nossa é uma situação simpática. Se ele nos
caluniou, tanto eu como ele sabemos que é mentira dele. Se nos traiu, somos a
vítima e ele sabe que é nosso algoz. Então o problema é da consciência dele. Não
devemos cultivar animosidade, e sim perdoar. Não ficarmos manipulados, dominados pelo ódio,
odiando também.
Esquecer é outra coisa. Na luz da Psicologia profunda o perdão não tem nada a ver com o esquecimento. Na visão espiritualista o perdão é o total esquecimento. São dois pontos diferentes. Não devolver o mal depende de mim; esquecer depende da minha memória. Muita coisa eu queria esquecer e simplesmente não esqueço.
Se dou
um golpe num móvel e causou uma lesão nos tecidos da mão, essa lesão só vai
desaparecer com o tempo, quando o organismo se recompor. Eu posso reconhecer
que não devia ter feito, mas esse reconhecimento não tira o dano que causei.
À luz da
Psicologia profunda, o perdão é exatamente não devolver o mal. Tenha a raiva, mas não
a conserve que faz muito mal. Á predominância da natureza animal, sobre a espiritual,
questão 742 do Livro dos Espíritos. Sentimos o impacto e não temos como evitar
a raiva, é fisiológico, reagimos no momento. Mas conservar a mágoa é da minha
vontade.
Se eu
conservar a mágoa tenho um transtorno psicológico, sou masoquista, gosto de
sofrer. É tão maravilhoso quando a gente ouve: Coitado! E aí fica pior. O outro vai embora e
a gente fica aquele depósito de lixo, intoxicando-se. O racional é nos
libertarmos de tudo que nos perturba. Somos seres inteligentes e possuímos os
mecanismos de libertação.
Geralmente dizemos: Mas ele não devia ter feito isto comigo. Mas fez, o problema é dele. Quem rouba, quem furta é que é o ladrão. Já está encarcerado na consciência culpada. A visão psicológica do perdão é diferente da visão espiritualista do perdão. Como seres emocionais sentimos o impacto da agressão, mas não devemos nos revoltarmos, e trabalhemos para esquecer.
A medida que formos trabalhando, a mágoa, a ofensa, vai perdendo o significado. A medida que vamos descobrindo nossos valores, ela vai desaparecendo. Quando estamos de bom humor, ouvimos até desaforo e dizemos: "Sabe que você tem razão?" Quando levantamos de mau humor, só de a pessoa nos olhar, perguntamos: "Qual é o caso?" Não é o ato em si; é conforme nós recebemos o ato.
Divaldo
conta o caso de alguém que, na festa de aniversário, recebeu de uma pessoa que
não gostava dela, como presente, um vaso de porcelana, com um bilhete: "Recebe o meu
presente, e dentro dele o que você merece". Dentro dele havia dejetos humanos. No
aniversário da pessoa que havia enviado tal "presente", o nosso
personagem lhe enviou o mesmo vaso, com os dizeres: "Estou
devolvendo o vasilhame. O seu conteúdo coloquei num pé de roseira, e estou lhe
enviando as rosas que saíram dali".
É um ato
de perdão, devolver
em luz o que se recebe em
trevas. O esquecimento somente vem quando a memória se encarrega de
diluir a impressão negativa, o que demanda tempo, reflexão e auto-superação. Perdão
não é conivência com a coisa errada.
Quando
uma pessoa me agride, eu não estou de acordo com ele; simplesmente não estou
contra ele. Se meu filho age erradamente, está aturdido emocionalmente, é
ingrato, faz tudo quando me desagrada como se fosse de propósito, eu não estou
de acordo, é lógico. Mas eu não posso ficar contra ele. Porque mais do que nunca ele
precisa de mim; ele está doente. Não é normal, isto é, não é saudável uma
atitude assim.
Mas
então eu tenho o direito de me sacrificar? Sim, se aceitou a maternidade, a
paternidade, não há condição difícil. Ser co-criador é co-participador. Será que Deus nos
abandona toda vez que somos ingratos para com ele? que blasfemamos, que
fazemos tudo quanto não devemos? Então o perdão não é conivência com a coisa
errada. Não é uma atitude para fingir que tudo está bem.
Alguém
nos prejudica e nos pede desculpa. Respondemos: "Ok! mas ele me
paga". É melhor enfrentar a realidade. Quando alguém nos disser "me
desculpe", responderemos "Não posso. Hoje, eu não posso. Estou muito
magoado". A gente diz: "eu te perdôo!" e no outro dia
amanhece com dor de cabeça, porque não digeriu. O que devemos é não devolver o
mal que nos foi feito.
A pessoa
nos diz uma palavra grave, e nós conseguimos segurar. Aí ela diz "você me
desculpe, eu não tive a intenção... Você vai perdoar?" — Estou pensando. —
Mas então não perdoa? você não é espírita? sou espírita, mas, agora, não tenho
condição de perdoar, agora me dê licença. Geralmente, dizemos: "Perdôo de
todo o meu coração"; perdoa, mas com ele nunca mais.
E ainda
pensamos: "Quem
me fizer, faça bem feito, porque não vai ter outra oportunidade". Entretanto, o meu
problema não é com ele, é comigo. Seja gentil com você. Se eu me permito viver
magoado, ressentido, sofrendo, como vou amar o outro?
Eu
mereço ter uma vida melhor. Ao chegar ao escritório: "Bom dia!", o
outro responde: "não vejo porque seja tão bom assim". Não nos
ofendermos com isso; se ele está de mau humor é problema dele, a doença do mau humor
requer tratamento psiquiátrico. Seja gentil com você. Ame-se. Não permita que
ninguém torne sua vida insuportável, nem para você, nem para os outros.
Divaldo conta o caso da pessoa que foi visitar um hospital de doentes mentais e lhe chamou a atenção, o psiquiatra. Noventa por cento dos agitados passavam perto do psiquiatra, uns diziam: Dr. já estou curado; ele respondia: Ok!; outros falavam absurdos, e ele ouvia, silenciava, ou concordava, e continuava a caminhada. No final, o visitante perguntou o por que da atitude dele, ao que respondeu: Eu sou saudável, não posso me atingir com o que dizem ou fazem, pois são doentes. E aí podemos perguntar: Será que a Terra não é um grande hospital?
A pessoa
saudável não faz o mal conscientemente a ninguém. Mas quando está de mal
consigo, agride o outro. Então seja gentil com você; seja honesto; está com raiva, admita.
Estou magoado, etc. Reprimir esses ressentimentos vai ficar lhe prejudicando. Digira sua raiva;
digira o ressentimento. Não os mantenha. Necessário deixar cicatrizar; às vezes
fica uma cicatriz e é necessário uma cirurgia.
Devemos nos empenhar em descobrir os nossos pontos vulneráveis. E Divaldo narra uma experiência pessoal. "Depois de anos de auto-análise, descobriu alguns pontos vulneráveis e começou a trabalhar esses pontos. Notou que atendendo o público, às vezes ficava irritado. E descobriu que o ponto vulnerável era o cansaço. Quando ia ficando cansado perdia um pouco a lucidez.
O
autógrafo é a oportunidade de ter um contacto com as pessoas. Alguns são
tímidos, não chegam para conversar, pensam que vai incomodar. Mas o atendimento
às vezes é prolongado. Começa 18h30 e vai até 1h30, 2h da manhã ainda está em pé. Quando a fila
estava grande, ficava ansioso. Fez sua autoterapia: Está ali porque quer; faz
porque gosta.
Certo
dia, uma senhora, o anjo bom, lhe disse: "Pelo menos me olhe". O sangue
subiu, voltou. — Muito obrigado, porque a senhora acaba de me ajudar.
"Como me fez bem. Descobri o ponto vulnerável".
Devemos dar o direito de a pessoa ser agressiva, mas não nos dar o direito de revidar a agressão. A raiva é semelhante a uma labareda, ou um raio. Pode provocar danos incalculáveis. É inesperada.
O
rancor é calculado. É necessário que aprendamos a colocar um para-raio e
evitemos os tóxicos do rancor. Porque esse rancor nos dá prazer. Observamos mesmo entre
os companheiros espíritas. Quando alguém que não lhe é simpático sofre algum
dano, algum sofrimento, a pessoa diz: "Ah! já esperava. Quando não faço,
Deus faz por mim". Deus é pai dele; do outro só é padrasto.
Não tenha prazer na infelicidade de alguém. Se devemos ter compaixão de quem sofre, devemos sentir prazer com a felicidade dos outros. Por seu intermédio, Bezerra de Menezes fez uma prece em que pede em favor dos que fazem os outros sofrerem. Geralmente pedimos pelos que sofrem, mas os que fazem sofrer estão em situação pior.
Geralmente,
quando alguém progride nós temos inveja. Deus sabe como ele conseguiu tal
coisa. Devemos
alegrar-nos com o triunfo dos outros. É uma forma de perdoar a vida, por não
nos haver dado aquilo que outro recebeu. Saúde, sucesso financeiro, são
responsabilidades, provações.