Se
perdoardes aos homens as faltas que cometerem contra vós, também vosso Pai
Celestial vos perdoará os pecados, mas se não perdoardes aos homens quando vos
tenham ofendido, tampouco vosso Pai Celestial vos perdoará os pecados. (Mateus,
6:14-15.)
Na época
em que o Mestre andou pela Terra espargindo as luzes do Evangelho, essa lição deve ter
causado estranheza a muitos, habituados que estavam à prática do "olho por olho e
dente por dente".
Não
admira, pois ainda hoje há os que preferem nortear suas ações pelos velhos
códigos de Moisés, achando que os preceitos de brandura e mansuetude, recomendados pelo
Cristo,
servem apenas para fazer covardes e vencidos.
Em
verdade, porém, enquanto não aprendermos a perdoar reciprocamente as faltas que
cometemos uns contra os outros, a dor e o sofrimento não serão banidos deste
planeta.
Por
não sermos capazes de perdoar, as prisões regurgitam de infelizes, os hospitais mantêm-se
repletos, inúmeras famílias desarmonizam-se e dividem-se, e os tribunais
permanecem pejados de processos e querelas de todas as naturezas.
Ódios,
rancores e desejos de represália lançam ondas mentais inferiores, maléficas,
à atmosfera que nos envolve, tornando-a escura, pesada, tensa, e, mergulhados em tal
ambiente, homens e nações vivem nervosos, agitados e irritadiços, em constantes
atritos ou conflitos domésticos, sociais e internacionais.
No texto
em epígrafe, o Mestre faz-nos sentir que, de um modo geral, todos temos dívidas
para com Deus, o qual, em Sua misericórdia, está sempre predisposto a no-las
perdoar,
desde que procedamos da mesma forma para com nossos irmãos.
Tal qual
o mau servo da parábola do credor incompassivo (Mateus, 18:21-35), porém, queremos que Deus
perdoe a multidão de nossos pecados, mas negamo-nos a desculpar a menor falta
que outrem cometa contra nós.
Assim
agindo, lavramos
nossa própria condenação, pois nossa intolerância, nossa incapacidade de suportar as
fraquezas e os erros alheios, quando nos sentimos prejudicados, têm como efeito a
invalidação de nossas súplicas de perdão ao Criador, porquanto é da Lei
que, para “RECEBER”, é preciso primeiramente “DAR”.
Portanto,
se não cobrimos com o manto do perdão as faltas cometidas contra nós, nossas
infrações às Leis Divinas também permanecerão descobertas na presença de Deus.
Esse
perdão, todavia, tem de ser sincero, e não apenas de lábios; deve compreender o
esquecimento completo e absoluto das ofensas. Deus não se satisfaz com
aparências
nem com simulacros, sabe o que vai no íntimo de cada coração, e só levará em
conta o indulto verdadeiro.
Há os
que dizem, em se referindo a seus ofensores: "Perdôo-lhes, mas não esqueço o
mal que me fizeram." Ou então: "Perdôo-lhes, mas não me reconciliarei com
eles." Ou ainda: "Perdôo-lhes, mas nunca mais quero tornar a vê-los em
minha vida."
Outros
afirmam, também, haver perdoado a seus desafetos, mas, se acontece serem eles
atingidos por alguma infelicidade, alegram-se intimamente com isso, e comentam
ou pensam:
"Bem feito! Receberam o que mereciam." Esses tais terão perdoado,
realmente? Não, e Deus tampouco lhes perdoará as culpas.
Toda e
qualquer manifestação de mágoa ou ressentimento indica que subsiste no espírito
do ofendido a lembrança daquilo que ele diz ou imagina haver perdoado; prova que a brasa da
aversão não está totalmente extinta, mas apenas recoberta por uma camada de cinza,
podendo ser reavivada ao sopro de um novo incidente qualquer.
Aprendamos,
pois, com o Cristo, a ser mansos e ternos de coração. Aconteça-nos o que
acontecer, não cedamos, nunca, a pensamentos de ódio e de vingança; isto poria em ação
forças destrutivas que, mais cedo ou mais tarde, reagiriam contra nós mesmos.
Certamente,
os
agravos que nos façam não ficarão impunes, mas deixemos a cargo da Providência
Divina a justa retribuição. Eis, para finalizar, mais uma recomendação do Novo
Testamento:
"Não
vos vingueis a vós mesmos... eu recompensarei, diz o Senhor. Pelo contrário, se
o vosso inimigo tiver fome, dai-lhe de comer; se tiver sede, dai-lhe de
beber... Não vos deixeis vencer do mal, mas vencei o mal com o bem". (Romanos,
12:19-21).
De “O Sermão da Montanha”, de Rodolfo Calligaris