03 - Visão Espírita da Bíblia

03 - Visão Espírita da Bíblia
José Herculano Pires

05 – Como a palavra de Deus ficou sujeita ao Homem

Os estudos bíblicos se processam no mundo em duas direções diversas: há o estudo normativo dos institutos religiosos, ligados às várias igrejas, que seguem as regras de hermenêutica e a orientação de pesquisas destas igrejas; e há o estudo livre dos institutos universitários independentes, que seguem os princípios da pesquisa científica e da interpretação histórica.

O Espiritismo não se prende a nenhum dos dois sistemas, pois sua posição é intermediária. Reconhecendo o conteúdo espiritual da Bíblia, o Espiritismo estuda à luz dos seus princípios, em harmonia com os métodos da antropologia cultural e dos estudos históricos.

Somente às religiões dogmáticas, que se apresentam como vias exclusivas de salvação, interessa o velho conceito da Bíblia como palavra de Deus. Primeiro, porque esse conceito impede a investigação livre. Considerada como palavra de Deus, a Bíblia é indiscutível, deve ser aceita literalmente ou de acordo com a "interpretação autorizada da igreja".

Por isso, as igrejas sempre se apresentam como "autoridade única na interpretação da Bíblia". Segundo, porque essa posição corresponde aos tempos mitológicos, ao pensamento mágico, e não à era de razão em que vivemos.

Vimos rapidamente as contradições insanáveis em que se afundam os hermeneutas religiosos. Vêem-se eles obrigados a perigosas ginásticas do raciocínio, apoiadas em fórmulas pré-fabricadas, para se safarem das contradições do texto.

Mas não escapam jamais à contradição fundamental, que é esta: consideram a Bíblia como a palavra de Deus, mas estabelecem, para sua interpretação, regras humanas. Dessa maneira, é o homem que faz Deus dizer o que lhe interessa.
Há no meio espírita alguns críticos agressivos da Bíblia. São confrades ilustres e estudiosos, que tomam essa posição em face das agressões religiosas à Doutrina, com base nos textos bíblicos.

A posição da Doutrina, porém, não é essa, como já vimos em Kardec. As supostas condenações do Espiritismo pela Bíblia decorrem das interpretações sacerdotais. A Bíblia é um dos maiores repositórios de fatos espíritas de toda bibliografia religiosa. E os textos bíblicos estão eivados de passagens tipicamente espíritas, como veremos.

06 - Toda a Bíblia está cheia dos Fenômenos Mediúnicos

O Espiritismo é apresentado por Kardec, sob a orientação do Espírito da Verdade, como uma seqüência natural do Cristianismo. É o cumprimento da promessa evangélica de JESUS, de enviar à Terra o Consolador, que completaria o seu ensino, esclarecendo os homens a respeito daquilo que ele só pudera ensinar através de alegorias, no seu tempo.

Os homens de então não estavam em condições de compreender o fenômeno natural da comunicação espírita, que misturavam com sistemas de magia e interpretações supersticiosas.

Em “A Gênese”, Kardec esclarece, no primeiro capítulo, que era necessária a evolução das ciências, o progresso dos conhecimentos, o desenvolvimento intelectual, para que o Espiritismo fizesse seu aparecimento, como doutrina, em nosso mundo.

Assim sendo, o Espiritismo tem como base as Escrituras, tem seus fundamentos na Bíblia. Mas é claro que o conceito espírita da Bíblia não pode ser igual ao das religiões que ficaram no passado, apegadas às formas sacramentais de magia, aos ritos materiais e aos cultos exteriores do próprio paganismo.

A Bíblia não pode ser, para o espírita esclarecido, a "palavra de Deus", pois é um livro escrito pelos homens, como todos os outros livros, e é, principalmente, um conjunto de livros em que encontramos de tudo, desde as regras simplórias de higiene dos judeus primitivos até as lendas e tradições do povo hebreu, misturadas às heranças dos egípcios e babilônios.

O Espiritismo ensina a encarar a Bíblia como um marco da evolução religiosa na Terra, mas não faz dela um novo bezerro de ouro.

É difícil falarmos da Bíblia a pessoas apegadas ao processo de fanatismo religioso de algumas seitas obscurantistas, que chegam, em pleno século vinte, ao cúmulo de renegarem a cultura, para só aceitarem os escritos judeus da época das civilizações agrárias.

São pessoas simples e crentes, que merecem o nosso respeito, mas inteiramente incapazes de compreender o problema bíblico. Isso, entretanto, não deve impedir-nos de esclarecer esse problema à luz dos princípios espíritas.

A Bíblia não condena o Espiritismo. Pelo contrário, a Bíblia confirma o Espiritismo, como demonstraremos. Basta lembrar o caso de Samuel, atormentado pelo espírito mau, aliviado pela mediunidade de Davi, que usava a música para afastá-lo. Caso típico de mediunidade curadora, constante de Samuel 16: 14-23.

E o colégio de médiuns que acompanhava Moisés no deserto? E assim por diante, da primeira à última página da Bíblia. Mas o pior cego é aquele que não quer enxergar.

Harmonia espiritual vai publicar semanalmente os capítulos que compõem esta maravilhosa obra de J. Herculano Pires.