07 - Visão Espírita da Bíblia


07 - Visão Espírita da Bíblia
José Herculano Pires

13 – Deuteronômio confirma Mediunidade de Moisés

Quem conhece o Deuteronômio, livro Bíblico sempre citado contra o Espiritismo, sabe que os seus melhores episódios são de ordem declaradamente mediúnica. O próprio Moisés é constantemente citado como "mediador entre Deus e o povo".

A palavra "médium" é moderna, mas quer dizer o mesmo que "mediador". A modernização dos textos bíblicos, feita por várias igrejas, chegou a incluir a palavra "médium" numa tradução clássica da nossa língua, mas somente quando aplicada para combater o Espiritismo.



Nenhum revisor sagrado das nossas traduções clássicas foi capaz da necessária coerência, substituindo a palavra "mediador", que se refere a Moisés, pela "perigosa" palavrinha espírita. Mas o leitor perspicaz, mesmo que não seja espírita, logo percebe a manobra.

O capítulo V do Deuteronômio é inteiramente mediúnico. Mas convém lembrar que os sucessos desse capítulo são melhor compreendidos quando lemos o Êxodo, capítulos 18 a 20. Nos versículos 13a 16, do Capítulo 18, vemos Moisés diante do povo, para ser o mediador, o intérprete, mas na verdade o médium  entre Deus e o povo.

Nos versículos 22 a 31 do Capítulo X do Deuteronômio, temos uma bonita descrição de conhecidos fenômenos mediúnicos: o monte Horebe envolto em chamas, a nuvem de fluidos ectoplásmicos (materializantes), e a voz direta de Jeová, que falava do meio do fogo, sem se apresentar ao povo.

E Moisés, como sempre, servindo de intermediário, na sua função mediúnica. Por fim, Jeová recomenda a Moisés que mande o povo embora, mas permaneça com ele, para receber as demais instruções. (Versículo 31 do Capítulo 5 de Deuteronômio).

No famoso Capítulo 18 de Deuteronômio, tão citado contra o Espiritismo, logo após os versículos das proibições, temos a promessa de Jeová, de que suscitará um grande profeta para auxiliar e orientar o povo. Como fazia com Moisés, o próprio Jeová promete que porá as suas palavras na boca desse novo médium.

Não obstante, sabendo que todo médium está sujeito a envaidecer-se e dar entrada a espíritos perturbadores, Jeová determina que o profeta seja morto: "se falar em nome de outros deuses".

Esta passagem (versículo 20 do Capítulo XVIII) é uma confirmação bíblica do ensino espírita de que, naquele tempo, os espíritos eram chamados "deuses".

Jeová era espírito-guia do povo hebreu, e por isso considerado como o seu deus, o único verdadeiro. Mas os profetas de Jeová podiam receber outros deuses, como Baal, Apoio ou Zeus, pelo que a proibição bíblica nesse sentido é terrível e desumana, como podemos ver nos textos.

A evolução espiritual do povo hebreu permitiria a Jesus vir corrigir esses abusos e substituir a concepção bárbara de “Deus dos Exércitos” pela concepção evangélica do “Deus Pai”, cheio de amor com todas as criaturas.

14 – Como os Homens conseguem Amoldar a palavra de Deus

Entre as curiosas contradições dos que aceitam a Bíblia como a palavra de Deus, podemos citar o caso das alterações do texto, com a finalidade de adaptá-lo a interesses sectários.

Essas alterações vêm de longe e constituem um dos campos mais interessantes dos estudos bíblicos. Kardec menciona, no capítulo quarto de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, uma referência livre de Jó à reencarnação, que aparece modificada na tradução católica de Sacy (francesa), na tradução protestante de Osterwald e na tradução da Igreja Ortodoxa Grega. Nesta última, que é a mais próxima do texto original, o princípio da reencarnação está evidente.

Outra citação de Kardec, no mesmo capítulo, é de Isaías (Capítulo 26, versículo 19) em que a expressão bíblica é bastante clara: "os teus mortos viverão; os meus, a quem deram vida, ressuscitarão".

Essa passagem, como outras, é adaptada nas traduções, para esconder a crença dos profetas na reencarnação. O texto de Jó (Capítulo 15, versículos 10-14), aparece desta maneira na versão grega ortodoxa: "Quando o homem está morto, vive sempre; findando-se os dias da minha existência terrestre, esperarei, porque a ela voltarei novamente".

Temos aí uma síntese admirável do princípio da reencarnação, de pleno acordo com o Espiritismo: “morto o homem, não fica enterrado, mas ressuscita no corpo espiritual, como ensina o apóstolo Paulo”. Ressuscitado, espera no mundo espiritual o momento de voltar à vida terrena, a fim de prosseguir no seu desenvolvimento.

Todas as alterações, como se vê, caem fragorosamente diante dos estudos críticos da Bíblia, que revelam o verdadeiro sentido dos textos desfigurantes. E cada alteração corrigida mostra que os textos originais confirmam os princípios do Espiritismo.

Mas as alterações não se deram apenas no passado. Dão-se agora mesmo, aos nossos olhos. Examine o leitor a última edição da Bíblia feita pela Sociedade Bíblica do Brasil e impressa em São Paulo, nas oficinas da "Imprensa".

A tradução portuguesa é a clássica, de João Ferreira de Almeida, mas "revista e atualizada no Brasil". A revisão implicou a mudança de palavras, às vezes com a finalidade de enquadrar o Espiritismo nas condenações bíblicas às práticas da antiga magia.

É assim que, em l Samuel, como título do Capítulo 28, encontramos o seguinte: "Saul consulta a médium de En-Dor". E também no texto a palavra espírita "médium" foi incluída.

Mas no Capítulo 18 de Deuteronômio foram conservadas as expressões antigas: "adivinhos e feiticeiros". Que diria disso o bom padre Almeida? Como se vê, a palavra de Deus é moldada pelos homens, conforme as suas conveniências.

Harmonia espiritual vai publicar semanalmente os capítulos que compõem esta maravilhosa obra de J. Herculano Pires.