As Drogas e a Dependência
Octávio Caúmo Serrano
Revista Internacional de Espiritismo
Se a droga causa dependência, a dependência é também uma droga. Nenhuma novidade há no conceito acima. É voz corrente, que é preciso combater todo tipo de droga, porque ela destrói, além do corpo físico, o caráter do viciado.
O vício, todavia, não está apenas na droga, mas no jugo a que ela nos submete, prevalecendo sobre a vontade e deixando evidente a nossa fraqueza, quando se trata da administração da nossa vida.
A pergunta primeira a ser feita é:
por que as pessoas se drogam? A resposta óbvia é porque estão desajustadas e procuram fugir dos seus complexos, da sua tristeza, da insatisfação com a vida que levam.
Seja rico, seja pobre! Isso ocorre de maneira natural, porque compomos a humanidade de um mundo de provas e expiações, cuja característica básica é a imperfeição; na maioria das vezes, não por maldade, mas por ignorância sobre os verdadeiros valores a serem vividos e conquistados, em cada encarnação; por isso, nunca estamos satisfeitos.
Não temos um limite que nos satisfaça. Sem vontade própria, a grande porcentagem dos homens deixa-se conduzir pelos ouropéis (liga metálica de cobre amarelo que imita o ouro) com que os mais espertos nos iludem, prevalecendo-se da fraqueza das almas mal conduzidas, seja pela vontade própria vacilante, seja pela deficiência de orientação dos responsáveis pelo seu aprimoramento moral e espiritual.
Como esse problema é generalizado, qualquer um de nós corre o risco de cair na trama dos ardilosos, porque esses profissionais conhecem muito bem as sutilezas de como nos envolver, com falsas promessas de felicidade. Aliás, todos nós caímos na lábia deles, todos os dias.
Sabemos todos quais são os nossos objetivos primários: ter saúde, ter dinheiro e ter prazer. A par disso, um rosto bonito, um corpo sarado, o que já não é problema, porque as modernas técnicas de embelezamento e reforma do corpo humano solucionam tais problemas, com grande facilidade.
Põe-se um pouco aqui, tira-se um pouco ali, aspira-se o que está demais, enxerta-se onde há de menos, estica, encolhe e está aí o modelo humano perfeito. Artificial, é verdade, mas que importa, se causa prazer e dá idéia de felicidade. O resto fica por conta dos nossos sentidos desequilibrados.
É por isso que, quando falamos de drogas, temos de definir quais são elas. Se uns são dependentes químicos, outros são dependentes físicos ou psicológicos. A estrada que nos leva ao fundo do poço é, inicialmente, uma passagem espaçosa e confortável que, aos poucos, vai afunilando até se tornar um atalho de mão única para o caos.
Mas não começou assim. A dependência química, lamentável sobre todos os aspectos, pode muito bem ter iniciado por dependência psicológica, produto da infelicidade vivida pela pessoa que deseja castelos, mas não pode viver nem num barraco.
Sonha com o céu, na terra, mas pensa construí-lo na preguiça, na ociosidade, na burla, vivendo à custa dos outros. Aos poucos, esse céu vai ficando distante, até se transformar num inferno.
Primeiro, era o desejo de ter a roupa de grife, a TV da moda, o carro do ano, o celular de melhor tecnologia. Depois, o status das altas rodas, onde impera a mediocridade das idéias vazias, onde só se discutem a marca dos vestidos, a grife das jóias e os cargos dos privilegiados que, quase sempre, foram postos em lugares onde não sabem conduzir-se.
Começa a vida artificial. O simples não cabe mais nas suas ambições. É preciso ser sui generis, diferente, e ter o nome em evidência, sempre citado na coluna social. Quando, portanto, julgamos um drogado, considerando-o um fraco, que faz viagem sem volta, voltemos os olhos para dentro de nós e percebamos quantas drogas nos consomem, apesar de considerar-nos equilibrados.
Se já vencemos as drogas que moram do lado de fora, porque não alimentamos os traficantes do crack, nem os da maconha e os da cocaína e nem fazemos uso do álcool, do fumo, mas ainda somos escravos das que moram no lado de dentro, porque nossa vida não é nossa; vivemos para nos exibir e alimentamos os traficantes de ilusões.
Todos os seres humanos são vaidosos, egoístas, orgulhosos, impacientes, melindrosos e insatisfeitos com tudo e com todos. Vemos mais defeitos que virtudes, em tudo aquilo que nos rodeia. Criticamos o governo, a polícia, o médico.
No entanto, somos os grandes responsáveis pelas nossas doenças, nascidas da ansiedade. Se não freamos, logo, essas angústias, não podemos garantir que, daqui a pouco, seremos novos consumidores das drogas convencionais.
Drogas que, muitas vezes, são prescritas pelos próprios médicos que lidam com as doenças da alma. Dopam mais do que curam.
Nunca elas se espalharam tanto, porque nunca as famílias estiveram tão desagregadas, e os pais nunca foram tão incompetentes na educação dos seus filhos.
Os valores morais não têm prioridade na educação. Privilegia-se o mundo material, dando ao filho a melhor escola, o melhor médico, o melhor videogame e outras parafernálias que a TV e a internet, os Shoppings e os Telemarketings tão bem divulgam.
Ensina-se aos filhos – especialmente os que ostentam nomes importantes – que seus rebentos têm o direito de exigir da sociedade que os aceitem e os desculpem, usando o sobrenome notório, quando precisarem de defesa.
Todas as pessoas, especialmente os que são ou serão pais, deveriam ler, em O Livro dos Espíritos, sobre a Infância – perguntas 379 a 385.
As clássicas frases “você sabe com quem está falando?” ou “você sabe de quem eu sou filho?”, a cada dia, são mais usadas para abrirem portas de fuga, em caso de corrupção moral ou financeira.
Ao passarem a mão na cabeça do filho, os pais não percebem que os empurram para o abismo. Devemos lastimar e dar toda ajuda aos dependentes de drogas, sem esquecer, porém, que todos nós somos dependentes de alguma maneira.
Mesmo as dependências que não percebemos: dependentes do corpo, do pensamento, do prazer, da comida, que são, muitas vezes, o atalho mais curto para se chegar às drogas convencionais.
Pare, antes da hora fatal, porque, quando chegar na descida, você não segura mais o carro que o conduzirá ladeira abaixo, na rota da encarnação.
Como ainda nos falta estrutura para vencer os defeitos, substituindo-os pelas mais elementares virtudes, livremo-nos, pelo menos, dos vícios. Como estão fora de nós, é bem mais fácil.
E, neste 31 de março, quando, em 1869, desencarnava Allan Kardec, renovemos a ele nossos agradecimento por tudo que nos deixou, à custa de muito sacrifício.
Se acreditarmos nas orientações dos Espíritos, não façamos da nossa vida uma droga! Tudo o que escrevemos até aqui aprendemos com o Mestre francês.
Boa sorte a todos nós!