08 - Visão Espírita da Bíblia

08 - Visão Espírita da Bíblia
José Herculano Pires

15 – Expressões e Palavras desfiguradas na Bíblia

Estamos vivendo uma fase de intensa reformulação dos textos bíblicos. A “Palavra de Deus” vem sendo alterada, modificada e muitas vezes arranjada, de acordo com os interesses dos homens. Já existe mesmo uma tradução da Bíblia que se diz aceitável pêlos materialistas.

A velha discussão sobre a “Vulgata Latina” levou os novos tradutores a recorrerem ao texto hebraico. A tradução clássica do “Padre Figueiredo”, segundo a Vulgata, é acusada de suspeitas, preferindo-se a do “Padre Almeida”, que como vimos, também já foi modificada.



O religioso esclarecido sabe muito bem que as versões antigas da Bíblia estão superadas. Mas há os que nada entendem e consideram o velho livro como intocável e imutável.

Esses acreditam cegamente nas pretensas condenações ao Espiritismo. Para eles, só podemos repetir as palavras de Jerônimo de Praga, quando uma velhinha beata levou mais uma racha de lenha para a fogueira em que o queimaram: “Sancta Simplicitas”.

A tradução dinamarquesa da Bíblia não trata dos “dons espirituais”. O teólogo Haraldur Nielsson explica-nos a razão dessa aparente discrepância. Pasmem os defensores do dogma da graça, que consideram Deus como chefe do partido a que pertencem!

O tradutor categorizado da Bíblia para o islandês, o reverendo Nielsson, que fez a tradução a serviço da “Sociedade Bíblica Inglesa”, declara: “No texto grego está a palavra “Espíritos” e não a expressão “Dons Espirituais”.

E acrescenta: “Em muitas traduções da Bíblia, esta passagem foi verificada de maneira confusa apesar de não haver a menor dúvida quanto à verdadeira significação dos termos gregos do texto original: “epei zelotai este pneumaten”.

Nielsson adverte ainda que os tradutores e revisores da Bíblia nem sempre tiveram a coragem de traduzir com exatidão os textos originais que se referem claramente à comunicação dos Espíritos.

E faz, corretamente, uma grave denúncia: “Os teólogos prenderam os seus sistemas em pesadas e estreitas cadeias”. A Bíblia, estudada segundo o espírito que vivifica, sem os prejuízos da letra que mata, revela a sua face espirítica e por tanto mediúnica, como o demonstra o reverendo Nielsson e como afirmou Kardec. Trataremos mais amplamente dos Dons Espirituais.

16 – Epistolas testemunham Mediunidade Apostólica

A expressão “Dons Espirituais”, como a expressão “Espírito Santo”, não aparece nos textos bíblicos originais. O reverendo Nielsson declara, com sua autoridade de teólogo e tradutor da Bíblia: “Os termos da Vulgata Latina, “spiritum bonum”, correspondem exatamente aos dos originais gregos. A Vulgata não fala absolutamente em “Espírito e Espírito Santo”.

Isso, no tocante ao “Novo Testamento”, pois no Velho só se fala em “Espírito e Espírito de Deus”. Quanto aos “Dons Espirituais”, a situação é a mesma. Essa expressão aparece apenas nos textos paulinos, com a palavra grega “charismata”, que significa literalmente “mediunidade”, ou seja, a graça de ser intermediário entre os “Espíritos e os Homens”.

Os estudos do Reverendo Haraldur Nielsson, enfeixados no livrinho “O Espiritismo e a Igreja”, recentemente lançado, esclarecem bem este assunto. Nielsson nos mostra, com sua imensa autoridade, que a palavra “transe” vem da Bíblia, derivando diretamente de “êxtase”.

Eis uma das suas afirmações: “O próprio Paulo nos diz que estava freqüentemente em transe. O apóstolo Pedro conta-nos a mesma coisa”. E a propósito de João e sua advertência para examinarmos “se os Espíritos são de Deus”, lembra que Paulo também adverte que: “ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz anátema contra Jesus”. (l Cor. XII:3).

A mediunidade era usada entre os judeus e entre os cristãos primitivos, e Nielsson acentua textualmente: “Segundo a concepção dos tempos apostólicos, os Espíritos podiam ser bons ou maus, muito evoluídos ou inferiores e atrasados”.

Isto explica as advertências apostólicas, pois nas assembléias cristãs manifestavam-se também os maus Espíritos, amaldiçoando o Cristo para defenderem o Judaísmo ortodoxo ou mesmo para defenderem as religiões politeístas, que também usavam a mediunidade.

Vemos assim como são inúteis os ataques ao Espiritismo em nome da Bíblia, que é um livro mediúnico. E como os espiritistas e o Espiritismo nada têm a temer da Bíblia.

É preciso apenas mostrar a verdade sobre a Bíblia, separar o que há nela de humano e divino, não aceitá-la de olhos fechados, dogmaticamente, como “a palavra de Deus”, o que é simples absurdo proveniente de épocas de fanatismo.

A Bíblia é muito valiosa para os espiritistas estudiosos, porque é o maior e mais vigoroso testemunho da verdade espírita na Antiguidade.

 17 - Como os Apóstolos faziam as suas Sessões Espíritas

Qual era o culto dos cristãos na Igreja Primitiva? Que responda o apóstolo Paulo, na “1 Epístola aos Coríntios”. Nas suas instruções para a celebração da ceia, (XI: 17-34), Paulo nos mostra que esta era simbólica e memorial.

Não se tratava propriamente de uma ceia, mas de uma cerimônia religiosa, e os participantes já deviam ter tomado em casa o seu alimento, para não perturbarem a reunião.

Comia-se o pão e bebia-se o vinho. Um pequeno pedaço de pão e uma pequena taça de vinho, em memória do Senhor. Veja-se a advertência do versículo. 34: "Se alguém tem fome, coma em casa, a fim de não vos reunirdes para juízo".

A cerimônia simbólica de pão e de vinho não era privativa dos cristãos. Os próprios cananitas a usavam, a ceia maçônica primitiva se constituía dela, e as religiões idólatras a praticavam para os pagãos; o pão representava a deusa Ceres e o vinho o deus Dionísio.

Para os cristãos, o pão representava a matéria e o vinho o espírito. A união do espírito com a matéria produzia a “comunhão”, que tanto pode ser a encarnação do espírito quanto a incorporação, o nascimento do ser humano ou a união de espírito como o profeta para a transmissão da comunicação mediúnica.

Os profetas eram chamados “pneumáticos”, na expressão grega do texto, que quer dizer: “cheios de espírito”. Havia dois tipos de espíritos: os de Deus, que eram bons, e os do Mundo, que eram maus. A respeito das comunicações, Paulo é incisivo:
“A manifestação do espírito é concedida a cada um, visando a um fim proveitoso”.

Reunidos os pneumáticos à mesa, em ordem, não se devia permitir o tumulto. Paulo avisa: “Tratando-se de profetas, falem apenas dois ou três, e os outros julguem”. Do Capítulo XI ao XIV, Paulo ensina como se fazia a reunião “pneumática” da Igreja Primitiva, e essas regras são as mesmas das sessões mediúnicas de hoje.

O dogmatismo desfigurou a pureza do texto, através de interpretações errôneas ou capciosas. Mas, apesar disso, o texto conserva o sentido verdadeiro, mesmo nas traduções atualizadas. As citações acima são da tradução de “Almeida”, na recente edição da Sociedade Bíblica do Brasil, na qual foi introduzida a palavra “médium”.

O estudo das expressões de Paulo nessa epístola, à luz dos estudos históricos e em confronto com todo o contexto escriturístico, mostra que os apóstolos e os cristãos primitivos faziam sessões espíritas.

E mostra mais: que nessas sessões, como nas atuais, manifestavam-se espíritos bons e maus; aqueles, dando instruções e estes, necessitando de orientação espiritual. Para esconder sua verdade, foram necessárias as “pesadas e estreitas cadeias” de que fala o reverendo Haraldur Nielsson em seu livro “O Espiritismo e a Igreja”.