Livre Arbítrio – José Sola
Revista Espiritismo e Ciência
O Livre Arbítrio é necessário para que possamos construir nosso próprio destino com mérito, tornando-nos participantes e co-criadores da vida. Uma interrogação milenar paira na mente dos homens de todos os tempos, desde as mais remotas eras até o momento presente.
Se Deus é realmente um Pai de amor, um Deus de misericórdia, bondade e justiça, por que, em vez de criar seres imperfeitos e sofredores, não os criou perfeitos e puros, sem sofrimentos, amarguras e tristezas? Não estaria Deus confirmando sua bondade e sua misericórdia se houvesse criado um universo somente de seres felizes, sem dores, lutas e sofrimentos?
E, partindo desse ponto de vista, chegam à cômoda dedução de que Deus não existe, que Deus é simplesmente um mito criado pelo homem, uma fuga, um ponto de apoio para as almas fracas e impressionáveis, além de afirmarem que somente os crédulos e supersticiosos é que necessitam desse suposto Deus para sobreviverem.
E aqueles que se dizem religiosos, quando interrogados sobre esse enigma, que é de importância fundamental para a sobrevivência da fé e da espiritualidade da alma, simplesmente respondem: “Não sei”; ou “Deus é justiça e amor, mas não é permitido interpretar os desígnios de sua soberana vontade”; “isto é um mistério do Criador”.
Esse problema fundamental tem levado uns à descrença, outros a uma fé cega e ilógica, a ponto de atribuir a Deus as responsabilidades das flagelações e dos males que ainda afligem a humanidade.
E a esse problema responderemos não conforme nosso ponto de vista, mas de acordo com os ensinamentos transmitidos pelos espíritos superiores, por meio da Doutrina Espírita, nos mais variados pontos da Terra, por centenas de médiuns.
Essas mensagens, transmitidas pelos espíritos em diversos países como: França, Inglaterra, Alemanha e outros, por médiuns que ignoravam o conhecimento dessas comunicações e, com mais forte razão, o conteúdo das mesmas, convergiam quanto aos postulados apresentados e, o que é mais extraordinário, contrariavam os dogmas das religiões ortodoxas, vividos pelos mesmos médiuns, que serviam como instrumento das comunicações.
O Espiritismo responde a esse enigma porque se utiliza da lógica, do bom senso e da razão como parâmetro de aferição na análise dos fenômenos que se manifestam de Deus na vida, e não porque tenha sido codificado utilizando-se do processo das comunicações mediúnicas, pois a mediunidade é um atributo de todos os seres humanos, independentemente da religião a que estejam vinculados.
Partindo do princípio de que a alma é criada no momento da concepção junto com o corpo físico, dificilmente encontraremos a solução do problema, pois esbarraremos em outro ainda maior.
Sendo Deus um pai de amor, bondade, misericórdia e justiça, por que cria seres deficientes físicos, em condições miseráveis, ao lado de outros que nascem em berço de outro, vivendo uma vida repleta de felicidades? A crença de que vivemos uma única vez na Terra compromete a Lei Divina, pois, se fosse verdade, Deus seria parcial, teria privilégios e párias.
Por outro lado, entendendo que somos vidas derivadas da vida suprema do Criador, concluímos que herdamos d’Este os atributos divinos de inteligência e de amor.
Esses atributos são desenvolvidos ao longo de experiências milenares, vividas a partir da maturação da substância, quando o psiquismo acontece; tem por berço primário o reino mineral, parar sonhar no reino vegetal, agitar-se no animal e despertar no homem.
Compreendendo isso, percebemos que a vida acontece na maturação do psiquismo, pelo processo evolutivo, que é uma determinação de Deus no universo. Após ter pago os tributos que a evolução reclama, o psiquismo desperta no ser humano, agora na condição de espírito racional e consciente, e se torna o construtor de seu próprio destino.
Assim, tem a liberdade de agir obediente aos desígnios do Criador, que é harmonia e amor, ou transgredir a Lei Divina, dessa forma sofrendo a conseqüência dessa transgressão.
Deus não castiga nem perdoa, como acreditam alguns religiosos. Para que Deus tivesse a necessidade de perdoar, teria que ter sido ofendido, o que não dá para conceber. Ele nos concede a vida e, com esta, o livre arbítrio, outorgando-nos a responsabilidade de construir o nosso próprio destino.
Por essa razão, percebemos a incoerência do Criador de se ofender diante das atitudes por nós tomadas a ponto de ter que nos perdoar; seria uma atitude contraditória por parte da inteligência suprema da vida. Não nos castiga, pois para nos castigar teria de ser mau, tanto quanto o próprio homem, deixando de ser o infinito amor do universo.
O Criador do Universo estabeleceu uma lei sábia e soberana, divina e imutável, para reger com justiça indefectível a legislação gloriosa do universo, estabelecendo como código cósmico a sentença divina, que faz com que cada criatura se condene ou absolva a si mesma, sentença esta que se resume no “amor”.
Realmente, a lei que rege o universo tem como código único o amor, e Jesus, pela gloriosa conquista realizada na evolução, se transformou no embaixador celeste, traduzindo-nos o pensamento de Deus. Este pensamento se manifesta na vida, no infinito do universo, em princípio de lei, equilíbrio e ordem, adaptando-a à concepção rudimentar em que ainda nos mantemos.
Jesus assimilou tão bem os desígnios e a vontade do Criador que nos afirmou que só o amor encobre a multidão de nossos pecados. O Amor é a essência divina no Criador, manifestando-se na vida, em toda parte, no infinito absoluto: é o berço em que florescem mundos, sóis, seres e criaturas.
O Livre Arbítrio está intimamente ligado à evolução conquistada por parte do espírito. Uma alma nobre, em cujo coração palpite viva a chama do amor, terá uma liberdade de consciência e de ação maior do que um espírito ainda refratário na evolução. Isso ocorre porque a alma acordada para o amor se define perante a vida e quer o melhor para si, tanto quanto para seus semelhantes.
Por outro lado, um espírito ainda interiorizado fará mal uso de seu livre-arbítrio, prejudicando-se e prejudicando seu próximo. Somos os construtores de nosso próprio destino.
O nosso hoje é resultante de nossas ações anteriores, nosso amanhã será aquilo que fazemos hoje. Não nos esqueçamos que se colhe na vida aquilo que na vida se semeia.
Em vista disso, é natural que se compreenda que o livre-arbítrio estabelece determinada posição para cada alma, porquanto cada espírito deve a si mesmo a situação em que se coloca. Possuis hoje aquilo que destes ontem. Amanhã granjearás o que vens dando. Hoje conheces e sabes o que aprendeste. Amanhã saberás o que estudas.
Se almejas a conquista da paz e da felicidade, observa os códigos divinos que nos foram apresentados por Jesus, semeando a semente de amor onde quer que estejas, e teu porvir será de glórias.
Quando fores visitado pela dor, quando as amarguras te avassalem a alma, não critiques, nem censures ao próximo ou a providência divina, pois sabes que és o construtor de teu próprio destino, e que as desarmonias em que te envolves são as resultantes de tua transgressão para com a Lei Divina.
Sabemos que existem aqueles que ainda se mantêm ignorantes quanto às realidades da vida e cobram da parte do Criador uma vida de perfeição, em que não houvesse a necessidade de construir nosso próprio destino, pagando à vida o tributo que esta nos exige.
No entanto, se Deus nos criasse perfeitos como o pretendem os adeptos da lei do “mínimo esforço”, não seríamos filhos livres, no direito de agir e participar da obra da criação, seríamos robôs programados para realizarmos as tarefas impostas por parte do Criador.
Criado perfeito, o espírito se veria privado de construir meritoriamente o seu destino. Não seria um participante da vida, um co-criador, seria um agraciado por Deus para viver em eterna contemplação. Mas, como visto, o espírito é o produto da maturação da substância a partir do reino mineral, vegetal e animal, transformando-se, enfim, na obra prima do Criador.
Se o espírito fosse criado perfeito, a Lei Divina seria abolida ou alterada em seus atributos de justiça e amor, pois, como sabemos, há uma semelhança psíquica, anatômica e biológica entre o animal e o homem.
Não somos perfeitos como o querem os adeptos da preguiça e da ociosidade. No entanto, somos perfectíveis, pois trazemos os atributos de inteligência e de amor em potenciação no núcleo da alma, a exteriorizar-se pela maturação do ser no infinito evolutivo que lhe está reservado.
Não fôssemos os construtores de nosso próprio destino, cabendo-nos a responsabilidade de nossos próprios atos, tanto quanto de nossa própria situação, e nossa eternidade seria tediosa. Talvez seja este o motivo de Lúcifer haver se rebelado contra Deus.
Pelo apresentado, concluímos que Deus manifesta sua vida no infinito do Universo e que nós somos vidas exteriorizadas desta vida. Somos a resultante da maturação da substância que, a partir do reino anímico, nos propicia viver a gloria da vida na condição de inteligências imortalizadas, em ascensão infinita para Deus.